Enforcement da patente de método

Uma patente pode reivindicar exclusividade sobre um produto ou sobre um método dotado de aplicação industrial.

Quando um processo industrial — um método de fabricação de um medicamento ou o método de produção de uma liga metálica, por exemplo — é reivindicado em uma patente e o titular da referida patente suspeita de que um terceiro está replicando o objeto da referida patente, como o titular irá comprovar a infração do terceiro?

A pergunta se faz pertinente, porque, de um modo geral, as instalações industriais destinadas à fabricação de um produto, são cercadas por muros, paredes, cercas e outros obstáculos físicos que impedem o acesso do terceiro não empregado ou não prestador de serviços da referida fábrica.

Para quem pensa que é fácil obter acesso ao interior de uma fábrica sem ser convidado, faça o seguinte teste: telefone agora para a fabricante do seu veículo e diga que fará uma visita às instalações deles, diga também que pretende tirar algumas fotos da linha de montagem deles, veja o que eles respondem. 

Muitos indivíduos, por pensarem que o enforcement da patente de método é impossível, dada a dificuldade de coleta de provas nesses casos, acabam por desistir de patentear métodos industriais por conta dessa desconfiança.

Para contornar esse empecilho, a lei de propriedade industrial brasileira (lei 9279 de 1996, a LPI) traz em seu artigo 42 parágrafo 2º o mecanismo da “inversão do ônus da prova” para esse tipo de situação.

    Art. 42. A patente confere ao seu titular o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos:

        I – produto objeto de patente;

        II – processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado.

        § 1º Ao titular da patente é assegurado ainda o direito de impedir que terceiros contribuam para que outros pratiquem os atos referidos neste artigo.

        § 2º Ocorrerá violação de direito da patente de processo, a que se refere o inciso II, quando o possuidor ou proprietário não comprovar, mediante determinação judicial específica, que o seu produto foi obtido por processo de fabricação diverso daquele protegido pela patente.

O referido dispositivo determina que, se o suposto infrator ao ser autuado judicialmente, não conseguir comprovar que o seu medicamento, a sua liga metálica, a sua ferramenta, peça ou produto, foi fabricado de forma diferente, será entendido que o suposto infrator realmente infringe a patente em questão. 

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Veja o que diz a doutrina a respeito do parágrafo 2° do artigo 42 da LPI:

O § 2º deste artigo estabelece de forma inequívoca que, em caso de alegação de infração de reivindicação de processo, cabe ao alegado infrator o ônus da prova de que o produto por ele fabricado, usado, vendido, exposto à venda etc. foi obtido por meio de processo diverso daquele patenteado.

A inversão do ônus da prova nesta situação é cabível, na medida em que, em alguns casos pode ser praticamente impossível para o titular a comprovação de que o produto infrator foi fabricado pelo processo de sua patente. 

Neste aspecto, o acordo Trips (art. 34.1) advoga a inversão do ônus da prova ao menos em duas circunstâncias específicas, ressaltando, porém, que devem ser considerados legítimos interesses do acusado em proteger seus segredos de fábrica e de negócio (art 34.3). Não obstante a ausência de previsão expressa a este respeito na presente Lei, é razoável que a inversão do ônus da prova não sujeito o acusado a relar mais do que o estritamente necessário para comprovar que o processo utilizado difere daquele patenteado. Assim, detalhes específicos sobre o processo utilizado podem ser omitidos, desde que isto não prejudique a referida comprovação.  (Comentários à Lei de Propriedade Industrial – 3ª Edição – Renovar – Instituto Dannemann Siemsen de Estudos Jurídicos e Técnicos) 

Veja o que diz o artigo 34 TRIPS:

ARTIGO 34 Patentes de Processo: Ônus da Prova 1. Para os fins de processos cíveis relativos à infração dos direitos do titular referidos no parágrafo 1(b) do ARTIGO 28, se o objeto da patente é um processo para a obtenção de produto, as autoridades judiciais terão o poder de determinar que o réu prove que o processo para a obter um produto idêntico é diferente do processo patenteado. Consequentemente, os Membros disporão que qualquer produto idêntico, quando produzido sem o consentimento do titular, será considerado, na ausência de prova em contrário, como tendo sido obtido a partir do processo patenteado, pelo menos em uma das circunstâncias seguintes: a) se o produto obtido pelo processo patenteado for novo; b) se existir probabilidade significativa de o produto idêntico ter sido feito pelo processo e o titular da patente não tiver sido capaz, depois de empregar razoáveis esforços, de determinar o processo efetivamente utilizado. 2. Qualquer Membro poderá estipular que o ônus da prova indicado no parágrafo 1 recairá sobre a pessoa a quem se imputa a infração apenas quando satisfeita a condição referida no subparágrafo (a) ou apenas quando satisfeita a condição referida no subparágrafo(b). 3. Na adução da prova em contrário, os legítimos interesses dos réus na proteção de seus segredos de negócio e de fábrica serão levados em consideração.

Veja o que diz a jurisprudência Nacional:

“PROPRIEDADE INDUSTRIAL” – Juízo “a quo” que deferiu a antecipação da tutela de mérito para determinar a suspensão da aquisição, fabricação, importação e comercialização de substâncias químicas específicas – Decisório que não merce subsistir – Ausência dos requisitos enunciados no art. 273 do CPC – Patente da autora que diz respeito apenas a processo produtivo – Recorrente que, destarte, deve ter a oportunidade de demonstrar previamente que seus produtos resultaram de processo de fabricação distinto daquele patenteado – Aplicação do disposto no art 42, § 2º, da lei nº 9279/96 – Revogação da medida liminar que se impões – Agravo provido. (…) Logo, é de ser facultada previamente a demonstração, pela recorrente, de que seus produtos resultaram de processo de fabricação distinto daquele patenteado, o que induz, neste momento, à revogação da medida liminar TJSP, 10ª Câmara de Direito Privado Des Paulo Dimas Mascaretti, Agravo de Instrumento nº 393.667.4/0-00 , 20 de setembro de 2005. 

“De forma afoita poder-se-ia deduzir pela improcedência da ação no que toca a essas patentes, já que a questão controvertida não restou satisfatoriamente esclarecida; todavia assim não se dá. É que, conforme insistentemente tentaram demonstrar as autoras, a Lei impõe à ré o dever de provar que o seu produto foi obtido por processo de fabricação diverso daquele protegido pela patente. (…) Tal dispositivo traz regra específica a respeito do ônus probatório no caso de alegada violação de processo ou produto obtido por processo patenteado, atribuindo ao réu a incumbência de demonstrar a diversidade entre seu método de produção e o processo patenteado” Juízo da 16ª Vara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, J. Jaciara Jacinto da Silva, AO 583.00.2010.136075-6, J 09.03.2011. 

Veja mais sobre os métodos de determinação de infração a patentes no seguinte artigo: tipos de infração de patente.

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