O consultor em patentes ouviu essa semana um dos maiores especialistas nacionais em leis de incentivo fiscal à inovação, Dr. Sidirley Fabiani.
Sidirley é sócio fundador da Gestiona, pesquisador na FEA-USP nas áreas de inovação e empreendedorismo; formado em Engenharia pela POLI-USP e em administração de empresas pela USP; além de mestrado em Empreendedorismo e Inovação na FEAUSP e pós-graduação no ITA. Atua há mais de 13 anos no segmento epigrafado, com foco em gestão da inovação, incentivos fiscais e captação de recursos para inovação.
Quais as principais leis de incentivo à inovação no Brasil? Pode fazer um breve resumo de cada uma delas? [o consultor]
Lei do Bem A Lei n.º 11.196, de 21 de novembro de 2005, conhecida como “Lei do Bem”, em seu Capítulo III, regulamentado pelo Decreto nº 5.798, de 7 de junho de 2006, criou benefícios fiscais à inovação tecnológica, dentre os quais destacam-se: * dedução, na apuração do Imposto de Renda devido, dos dispêndios com P&D, inclusive aqueles com instituições de pesquisa, universidades ou inventores independentes; * exclusão, na determinação do lucro real para cálculo do IRPJ e da base de cálculo da CSLL, do valor correspondente a até 60% da soma dos dispêndios efetuados com P&D. Este percentual poderá atingir 70% em função do acréscimo de até 5% no número de empregados que forem contratados exclusivamente para atividades de P&D; e 80%, no caso deste aumento ser superior a 5%. Além disto, poderá haver também uma exclusão de 20% do total dos dispêndios efetuados em P&D objeto de patente concedida ou cultivar registrado; * redução de 50% de IPI na compra de equipamentos (nacionais ou importados) destinados a P&D; * depreciação imediata dos equipamentos comprados para P&D; * amortização acelerada dos dispêndios para aquisição de bens intangíveis para P&D; * redução a zero da alíquota do imposto de renda retido na fonte nas remessas efetuadas para o exterior destinadas ao registro e manutenção de marcas, patentes e cultivares; * dedução, como despesas operacionais no cálculo do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, dos valores transferidos a microempresas e empresas de pequeno porte, destinados à execução de P&D, de interesse e por conta da pessoa jurídica que promoveu a transferência. [Sidirley]
Lei da Informática (não se trata exatamente de um incentivo à inovação, mas sim de incentivo à indústria)
A Lei de Informática (Lei nº 8.248/1991) é um instrumento de política industrial, criado no início da década de 1990 para estimular a competitividade e a capacitação técnica de empresas brasileiras produtoras de bens de informática, automação e telecomunicações. Sua aplicação na Zona Franca de Manaus (ZFM) é gerida pelo Comitê das Atividades de Pesquisa e Desenvolvimento na Amazônia – CAPDA, cuja coordenação é exercida pela Secretaria de Inovação e Novos Negócios.
Os incentivos proporcionados pela Lei estimularam e continuam estimulando a instalação de plantas fabris, a contratação de recursos humanos, o aumento da produção de bens de informática para o consumo no mercado brasileiro, dentre outros impactos positivos para a região. Os incentivos fiscais concedidos são:
• Redução do IPI de 80% até 2024, de 75% em 2025 e 2026 e de 70% de 2027 a 2029, para os produtos com PPB; ou
• Redução do IPI de 100% até 2024, de 95% em 2025 e 2026 e de 90% de 2027 a 2029, para os produtos com PPB e desenvolvidos no País (Tecnologia Nacional);
• Redução do ICMS na saída do produto incentivado em alguns estados;
• Suspensão do IPI na importação e na compra de insumos no País e
• Suspensão do ICMS na importação e na compra de insumos em alguns estados.
• Preferência na aquisição de produtos de informática, automação e telecomunicações desenvolvidos no País e com PPB, pelos órgãos e entidades da administração pública federal, direta ou indireta.
Rota 2030 (antigo InovarAuto)
Novo plano, lançado no dia 18 de abril de 2017 pelo Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, foi formulado junto à iniciativa privada e surgiu junto à necessidade de estabelecer um plano de incentivo à indústria automotiva por um período mais amplo do que o tradicional de quatro anos.
Como o Inovar-Auto não conseguiu alcançar todas as metas necessárias para o desenvolvimento do setor durante sua execução, a ideia é que o novo programa, vigorando entre 2018 e 2030, promova os incentivos necessários para a produção automotiva e faça a diferença na economia brasileira.
Objetivos da nova política
Ao contrário do atual plano brasileiro, a Rota 2030 deverá dar vantagens a produtos sustentáveis e com maior eficiência energética. Confira seus principais objetivos:
• incentivar as inovações tecnológicas no setor automotivo;
• promover um novo ciclo produtivo de veículos baseado em competitividade, alta produtividade e conceitos inovadores de mobilidade urbana;
• organizar ações que atendam às exigências de preservação do meio ambiente;
• reduzir a emissão de gases poluentes;
• garantir a segurança de motoristas e passageiros;
• conceder créditos tributários a empresas que produzem veículos no Brasil e também às empresas importadoras brasileiras.
Com isso, a ideia é chegar ao ano de 2030 com tecnologias de ponta, equivalentes às dos mercados globais, e fazer com que o Brasil desponte com projetos diferenciados e se torne um polo de produção de veículos. [Sidirley]
Ainda existe lei do Bem? Ela não havia sido revogada no final do Governo Dilma? [o consultor]
Na verdade a Lei do Bem quase foi suspensa, mas felizmente a medida provisória (MP) 694/2015, editada em 30 de setembro e que anunciava a suspensão do benefício fiscal previsto no Capítulo III da Lei 11.196/2005 perdeu a validade, pois no dia 8 de março de 2016 encerrou-se o prazo para conversão da MP 694/2015 em lei, que caiu por decurso de prazo, e, consequentemente, a Lei do Bem tornou novamente a viger.
Cumpre esclarecer que outra medida provisória, a MP 690, também editada em 2015, e, desta vez, convertida na Lei 13.241/2015, veio comprometer diretamente outras espécies de incentivos previstos na Lei do Bem. Em seu Capítulo IV (Do Programa de Inclusão Digital) a Lei previa a redução a zero das alíquotas da Contribuição para o PIS/Pasep e da Cofins incidentes sobre a receita bruta de venda a varejo de produtos de telecomunicação. Tal medida, diferente da MP 694, abrange, especificamente, a indústria de tablets, smartphones, celulares, roteadores e modems, que viu sensível oneração de seus produtos por meio do restabelecimento das alíquotas cheias de PIS/COFINS.
Nesse sentido, muitas vezes há certa confusão quando o assunto é Lei do Bem e medidas provisórias. É preciso deixar claro que são pontos distintos dentro de uma mesma Lei. Em resumo, a MP 694/2015 caiu por decurso de prazo, e os incentivos à Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação para as empresas brasileiras (Capítulo III) continuam válidos, enquanto que a MP 690/2015 foi convertida em Lei e restabelece as alíquotas cheias de PIS/CONFINS para certos produtos (Capítulo IV), comprometendo o incentivo para a venda destes.
Quais os requisitos para participação na Lei do Bem? [o consultor]
• Empresas instaladas no Brasil e que estejam no Regime Tributário do Lucro Real;
• Tenham Lucro Fiscal no Exercício (IRPJ e CSLL a recolher);
• Regularidade Fiscal (Emissão de CND ou CPD-EN);
• Invistam em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) no Brasil.
O que é lucro real? O que é Lucro presumido? [o consultor]
Lucro Real: o imposto de renda e a contribuição social sobre o lucro são determinados a partir do lucro contábil, apurado pela pessoa jurídica, acrescido de ajustes (positivos e negativos) requeridos pela legislação fiscal.
Também neste regime o PIS e COFINS são determinados (com exceções específicas) através do regime não cumulativo, creditando-se valores das aquisições realizadas de acordo com os parâmetros e limites legais.
Lucro Presumido: tributação simplificada do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro (CSLL). Entretanto, no Lucro Presumido, o limite da receita bruta para poder optar, a partir de 2014, é de até R$ 78 milhões da receita bruta total, no ano-calendário anterior. Outro detalhe é que as empresas tributadas pelo Lucro Presumido não podem aproveitar os créditos do PIS e da COFINS, por estarem fora do sistema não cumulativo, no entanto recolhem tais contribuições com alíquotas mais baixas do que aquelas exigidas pelo Lucro Real.
Qual o benefício da grande empresa que deposita pedidos de patente no Brasil e no Exterior com a lei do Bem? [o consultor]
O principal incentivo da Lei do Bem em relação à Propriedade Intelectual está restrito à patente concedida e não “apenas” depositada: exclusão, na determinação do lucro real para cálculo do IRPJ e da base de cálculo da CSLL, de 20% do total dos dispêndios efetuados em P&D objeto de patente concedida ou cultivar registrado.
Além disso, há também a redução a zero da alíquota do imposto de renda retido na fonte nas remessas efetuadas para o exterior destinadas ao registro e manutenção de marcas, patentes e cultivares. [Sidirley]
Em resumo, qual o procedimento para utilização dos incentivos da lei do bem? [o consultor]
A sistemática declaratória da fruição de tais incentivos fiscais possibilita a utilização dos benefícios pelas pessoas jurídicas que realizem pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica, dispensando a prévia formalização de pedido e aprovação dos projetos de P&D pelo MCTIC, cabendo ao próprio contribuinte concluir se ele cumpre ou não os requisitos previstos na legislação. A partir daí ele, de maneira, automática, elabora sua contabilidade usando ou não os benefícios, devendo controlar contabilmente os dispêndios em P&D em contas específicas. As pessoas jurídicas beneficiárias dos incentivos fiscais devem prestar ao MCTIC as informações anuais sobre os seus programas de pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológica até 31 de julho do ano subsequente de cada exercício fiscal através do Formulário Eletrônico aprovado pela Portaria nº 327, de 29 de abril de 2010.
Quais as obrigações acessórias para utilização da Lei do Bem? [o consultor]
As pessoas jurídicas beneficiárias dos incentivos fiscais devem prestar ao MCTIC as informações anuais sobre os seus programas de pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológica até 31 de julho do ano subsequente de cada exercício fiscal através do Formulário Eletrônico aprovado pela Portaria nº 327, de 29 de abril de 2010. Além disso, devem controlar contabilmente os dispêndios em P&D em contas específicas, manter toda a documentação relacionada aos incentivos à disposição da Receita Federal, bem como a comprovação de regularidade fiscal (CND ou CPD-EN) do respectivo período.
Em média, uma empresa de grande porte economiza quanto de seu imposto de renda ao se enquadrar nos benefícios da lei do Bem? [o consultor]
Considerando os dados oficiais mais recentes publicados, referentes ao ano-base 2014, podemos estimar, em média, R$ 1,7 mi/empresa. [Sidirley]
Quantas e quais (exemplos) empresas utilizam a Lei do Bem atualmente? [o consultor]
Fonte: MCTIC, 2014
O Gráfico anterior (período de 2006 a 2014) mostra que o número de empresas participantes do programa de incentivos fiscais e o número de empresas recomendadas pelo MCTIC (que atenderam às exigências da Lei do Bem com ou sem restrições) vêm crescendo a cada ano.
Pode-se dizer que as principais líderes de todos os segmentos da economia: automotivo, software, petroquímica, eletrônica, alimentos, bens de consumo, farmacêutica, metalurgia etc., utilizam os incentivos da Lei do Bem.
Neste link é possível baixar todos os Relatórios Oficiais do MCTIC até o ano-base 2014, que apresentam a lista de todas as empresas participantes nos respectivos anos. [Sidirley]
Qual o montante global de incentivos concedidos por ano? [o consultor]
Computando-se todos os benefícios fiscais das 991 empresas recomendadas no Ano-Base 2014, na tabela acima há evidência de um ganho real de renúncia fiscal total para as empresas no valor de R$ 1,68 bilhão de reais. Este valor quando comparado com o exercício fiscal do Ano-Base de 2013 (R$ 1,58 bilhão de reais), representa um acréscimo da ordem de 6,33%.
Como funciona o procedimento de análise de homologação dos incentivos? Qual o percentual de aprovação das empresas participantes? [o consultor]
O MCTIC utiliza auxilio técnico de Comitês formados por profissionais de notório saber nas áreas das atividades econômicas das empresas beneficiadas pela Lei do Bem. Esses Comitês emitem diagnósticos opinativos que subsidiam os Pareceres desse Ministério. Esses Pareceres contêm análise detalhada por projeto. Após prazo para Pedido de Contestação, o MCTIC emite Parecer Final e divulga Relatório contendo a relação completa de todas as empresas que enviaram o Formulário no prazo legal.
Cabe à RFB definir se a renúncia de cada empresa beneficiada é devida ou não. Esta competência (tributária) é exclusiva da RFB e também é dela o banco de dados que contém as informações das empresas que preencheram a DIPJ na parte que identifica as empresas que utilizaram estes incentivos. Cabe à RFB a verificação por meio de fiscalização da veracidade das informações, assim como realizar o cruzamento entre as informações contidas na DIPJ e às enviadas pelo MCTI à RFB, já que ela que tem competência legal em matéria tributária para verificar erro e/ou fraude em relação à eventual renúncia indevida de tributos.
Como a introdução do mecanismo de Parecer Técnico, o MCTIC passou a divulgar somente a lista das empresas participantes do Programa da Lei do Bem, tendo em vista é que possível a aprovação (ou reprovação) parcial dos projetos e dos dispêndios, mas podemos estimar que o índice de aprovação fica entre 75% e 85% dos projetos apresentados. [Sidirley]
Existe alguma alternativa para o pequeno empreendedor participar da Lei do Bem ou de outras leis de incentivo? [o consultor]
Infelizmente ainda há poucas opções no Brasil.
A Lei do Bem permite a dedução, como despesas operacionais no cálculo do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, dos valores transferidos a microempresas e empresas de pequeno porte, destinados à execução de P&D, de interesse e por conta da pessoa jurídica que promoveu a transferência.
Há diversos programas estaduais e até municipais de apoio às pequenas empresas. Podemos citar o O Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas – PIPE existe desde 1997. O programa destina-se a apoiar o desenvolvimento de pesquisas inovadoras, a serem executadas em pequenas empresas sediadas no Estado de São Paulo, sobre importantes problemas em ciência e tecnologia que tenham alto potencial de retorno comercial ou social.
O Programa de Apoio à Pesquisa em Empresas – PAPPE é uma iniciativa do Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT, realizada pela Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP em parceria com as Fundações de Amparo à Pesquisa – FAPs estaduais, que busca financiar atividades de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de produtos e processos inovadores empreendidos por pesquisadores que atuem diretamente ou em cooperação com empresas de base tecnológica. [Sidirley]
Contato de Sidirley Fabiani: sfabiani@gestiona.com.br