O quadro reivindicatório de uma patente é a parte mais importante desse documento, pois é por meio dele que se estabelece e se delimita a proteção conferida à uma invenção (art. 25 e 41, LPI). Por estes motivos, não é exagero dizer que o quadro reivindicatório é o coração da patente. Portanto, durante a elaboração de um pedido de patente, o quadro reivindicatório é a parte onde o redator deve dedicar a maior porção de seu tempo e energia, elaborando uma boa estratégia de proteção, buscando um vocabulário e léxico adequados e tentando cumprir todas as determinações impostas pelas diretrizes e normas formais que regulamentam a estrutura do quadro reivindicatório (vide IN30 e IN31 do INPI).
REIVINDICAÇÕES DE PATENTES FARMACÊUTICAS
Por essas razões, grande parte dos profissionais da área de patentes optam por escrever primeiro o quadro reivindicatório e só depois elaboram o descritivo e o resumo do pedido de patente.
FORMA GERAL DE UMA REIVINDICAÇÃO
Toda reivindicação deve atender à seguinte estrutura formal imposta pelo INPI:
Conforme exibido no quadro acima, toda reivindicação deve compreender:
- Um preâmbulo, que consiste de um trecho que antecede a expressão caracterizante, que se relaciona ao objeto alvo da invenção e define os elementos já compreendidos pelo estado da técnica (por estado da técnica, entenda, aquilo que já existia e já era de conhecimento público antes de sua invenção);
- A expressão caracterizante: caracterizado pelo fato de que, que serve para separar o preâmbulo da novidade; e
- A parte caracterizada: que constitui a parte nova agregada ao objeto alvo da invenção e aparece após a expressão “caracterizado pelo fato de que”.
Um quadro reivindicatório pode compreender dois tipos de reivindicação:
Reivindicações independentes; e
REIVINDICAÇÕES INDEPENDENTES
As reivindicações independentes são as reivindicações mais importantes de um quadro reivindicatório. Por analogia, se o quadro reivindicatório é o coração da patente, as reivindicações independentes são o ventrículo esquerdo desse coração; ou seja, elas constituem a parte mais importante da parte mais importante compreendida pela patente.
Infere-se, portanto, que as reivindicações independentes são os elementos que mais exigem trabalho e atenção do redator na construção de um pedido de patente. Toda patente deve ter, pelo menos, uma reivindicação independente, podendo ou não apresentar alguma reivindicação dependente em seu quadro reivindicatório.
O quadro reivindicatório de uma patente também pode compreender duas ou mais reivindicações independentes.
Quando um examinador afirma que um pedido de patente não tem atividade inventiva, novidade, aplicação industrial ou unidade de invenção, ele emite essa afirmação com base no teor das reivindicações independentes do pedido de patente, ignorando todo o restante do documento.
Sem uma reivindicação independente, a patente não teria valor algum como ferramenta garantidora de exclusividade de direitos. Na prática, a reivindicação independente é útil na comprovação da infração de um produto ou processo a uma determinada patente. Por esse motivo, as reivindicações independentes são a parte mais importante de todo o quadro reivindicatório.
QUAL A FINALIDADE PRÁTICA DE UMA REIVINDICAÇÃO INDEPENDENTE?
Tal como mencionado nas linhas acima, uma reivindicação independente é útil para determinar a infração de um determinado produto ou processo a uma determinada patente.
Em outras palavras, para que um produto A infrinja uma patente B, é necessário e suficiente que uma das reivindicações independentes da patente B seja infringida pelo produto A.
Se não entendermos como funciona na prática a determinação de infração a uma reivindicação independente, não somos capazes de redigir uma reivindicação adequada à proteção de um determinado objeto. Por esse motivo, segue, nas próximas linhas, uma discussão bastante sumária de como determinamos infração a uma reivindicação.
EXEMPLOS DE CASOS DE INFRAÇÃO
É pacífico entre os doutrinadores de propriedade industrial que, para que seja determinada a infração por um dado produto (ou processo) a uma determinada patente, é necessário que seja provado que todas as características definidas em, pelo menos, uma reivindicação independente dessa patente estejam compreendidas pelo suposto produto ou processo infrator.
Assim, tem-se:
No exemplo acima, o produto P1 não infringe a reivindicação independente nº1 da patente X, pois o produto P1 não compreende a característica C definida nessa reivindicação independente.
O produto P2 infringe a reivindicação independente de nº 1 da patente X, pois compreende todas as características nela definidas. O produto P3 também infringe a reivindicação nº 1, pois este compreende todas as características definidas na referida reivindicação. Nota-se que, mesmo compreendendo uma característica adicional F, o produto P3 infringe a reivindicação independente nº 1 da patente X. Portanto, no exemplo acima, são infratores da patente X, apenas os produtos P2 e P3:
EXCEÇÃO À REGRA:
Os doutrinadores da área de propriedade industrial criaram algo que se convencionou chamar de “Doutrina dos Equivalentes”. Consubstanciada no artigo 186 da LPI, a doutrina dos equivalentes define que, para que um produto seja considerado infrator, é suficiente que ele compreenda características substancialmente iguais às características definidas por uma reivindicação independente.
Segundo a referida doutrina, para determinar que uma característica de um produto P é substancialmente igual a uma característica de um objeto definido em uma reivindicação independente Y, é preciso que esta característica do produto P tenha:
- Substancialmente o mesmo formato que a característica do objeto definido na reivindicação independente Y;
- Substancialmente a mesma função que a característica do objeto definido na reivindicação independente Y; e
- Alcance substancialmente o mesmo resultado alcançado pela a característica do objeto definido na reivindicação independente Y.
No exemplo a seguir, o produto P4 infringe a reivindicação nº 1 da patente X apenas se a característica Z tiver substancialmente o mesmo formato, substancialmente a mesma função e alcançar substancialmente o mesmo resultado que a característica C da reivindicação nº 1 da patente X.
Note-se que a doutrina dos equivalentes é aplicada apenas quando existam características paralelas, na reivindicação e no produto infrator, que possam ser entendidas como equivalentes entre si. Quando a reivindicação define n características e o produto supostamente infrator revela n – 1 características (i.e., um número menor de características), em tese não é possível fazer uso da doutrina dos equivalentes para fundamentar uma infração.
Portanto, para citarmos um exemplo, a princípio não seria possível usar a doutrina dos equivalentes para fundamentar uma infração ao caso do produto P1, discutido acima. Isto porque a característica C da reivindicação 1 da patente X não é revelada em P1 nem de modo literal nem de modo equivalente.
Quando, para determinação de uma infração, for necessário fazer uso da doutrina dos equivalentes, diz-se que há “infração por equivalência”. Quando não é necessário usar a doutrina dos equivalentes, diz-se que há uma “infração literal”.
Um caso clássico de infração por equivalência seria a confrontação de uma reivindicação independente para uma mesa dotada das caraterísticas A, B, C, que compreende parafusos como elementos de fixação de suas peças e uma mesa comercializada por um concorrente do titular da patente, dotada das mesmas características A, B, C, mas que compreende pregos, em vez de parafusos, como elemento de fixação de suas peças.
COMO IDENTIFICAR UMA REIVINDICAÇÃO INDEPENDENTE?
Para que uma reivindicação seja classificada como independente, é suficiente que ela não revele uma relação de dependência definida em seu preâmbulo.
Exemplo:
- #### caracterizado pelo fato de que…
- #### de acordo com a reivindicação 1 caracterizado pelo fato de que…
- #### de acordo com as reivindicações anteriores, caracterizado pelo fato de que…
- %%% caracterizado pelo fato de que…
No exemplo acima, 1 e 4 são reivindicações independentes e 2 e 3 são reivindicações dependentes. Outro modo de identificar uma reivindicação independente é saber que, invariavelmente, em todo e qualquer quadro reivindicatório, a primeira reivindicação (i.e., a reivindicação de nº 1) será sempre uma reivindicação independente.
É bastante comum que um quadro reivindicatório contenha diferentes tipos de reivindicações independentes relacionadas a um mesmo objeto, sendo elas:
- Uma reivindicação para um produto (per se);
- Uma reivindicação para o processo de fabricação deste produto;
- Uma reivindicação para uma máquina ou ferramenta configurada para a fabricação deste produto; e
- Uma reivindicação para um método de uso deste produto.
A compreensão desses quatro tipos de reivindicações em um quadro reivindicatório é não apenas permitida por lei, mas é prática recomendada ao bom redator de pedidos de patente.
Evidente que, quando o processo de fabricação, a ferramenta de fabricação ou o método de uso do objeto forem conhecidos ou óbvios ao técnico no assunto, não há motivo para inserir essas reivindicações adicionais no quadro reivindicatório do documento. Entretanto, quando pairar o menor resquício de dúvida a respeito da obviedade dos mesmos, recomenda-se o uso dessas modalidades de reivindicações.
ESTRATÉGIA POR TRÁS DA ELABORAÇÃO DE UMA REIVINDICAÇÃO INDEPENDENTE
Uma das maiores dificuldades na elaboração de uma reivindicação independente é o estabelecimento de seu escopo de proteção. Uma reivindicação muito ampla será quase sempre indeferida por não revelar novidade ou atividade inventiva.
Por outro lado, uma reivindicação com escopo de proteção muito restrito será quase sempre deferida, mas dificilmente será útil na coibição da atividade de terceiros.
Partindo deste princípio, um exemplo bastante ilustrativo do processo de elaboração de uma reivindicação independente é revelado por Morgan D. Rosenberg em seu livro Patent Application Drafting (Lexis Nexis, 2015), onde é narrado o processo de redação de uma reivindicação independente para um bule metálico que compreende uma alça de material termicamente isolante:
Let’s say that an inventor invents a metal teapot with a thermally insulating handle so that the user doesn’t get burned. The inventor’s physical embodiement of the invention is an iron teapot, painted red, with a wooden handle.
Not considering prior art for the moment, how would you claim this? Would you claim the red iron teapot with a wooden handle? It should be obvious that the answer is a resounding “no”, since a competitor could produce a noninfringing copper teapot with a plastic handle, for example.
If, in a single independent claim, you recited every element and limitation (i.e. an iron teapot, an attached wooden handle, and the teapot is red), then the inventor would have no legal recourse against a copper teapot with a plastic handle. And, forgetting for the moment that colors rarely hold any patentable weight, another competitor could produce a blue iron teapot with a wooden handle which also does not read on the claims. A broad claim would claim exactly what the inventor invented before reducing the invention to practice: a metal teapot with a thermally insulating handle. As a good patent practitioner, you could make this even broader: a thermally conductive teapot with a thermally insulating handle. The narrow aspects, such as the materials used or the color, belong in the dependent claims (Rosenberg, 2015, p. 161).
Como a extensão do estado da técnica será sempre fator fundamental no atendimento aos requisitos de novidade e atividade inventiva pela reivindicação, antes que seja elaborada uma reivindicação independente é preciso que se conheça o estado da técnica da invenção. Do contrário, não há como estabelecer com segurança o escopo de proteção a ser reivindicado. Ao tomar conhecimento do estado da técnica, o redator não poderá escrever uma reivindicação tão ampla que incorpore grande parte do estado da técnica, nem tão pequena que estabeleça um escopo de proteção extremamente restrito para determinado objeto.
No exemplo abaixo, o objetivo é elaborar uma reivindicação para:
uma furadeira de parede dotada de uma broca de 20 centímetros, a broca sendo cravejada de diamantes cortantes.
Na busca de anterioridade para a referida tecnologia, foram encontradas cinco técnicas anteriores, sendo elas três documentos de patente e dois catálogos comerciais exibindo furadeiras. Nenhuma das cinco técnicas anteriores encontradas antecipa completamente a invenção, mas todas elas revelam furadeiras dotadas de características semelhantes às características da invenção.
Documentos do estado da técnica:
EXEMPLO 1 DE REIVINDICAÇÃO:
REIVINDICAÇÃO COM ESCOPO DE PROTEÇÃO MUITO AMPLO.
Reivindicação 1: “Ferramenta caracterizada pelo fato de que é configurada para perfurar paredes”.
No caso acima, a proteção conferida pela reivindicação é muito ampla. Todas as técnicas anteriores encontradas pelo redator se enquadram perfeitamente nessa definição.
Diz-se, portanto, que o escopo de proteção da reivindicação extrapola os limites do estado da técnica. Seria muito improvável que uma reivindicação tão ampla como essa fosse deferida por um examinador de patentes. Não bastasse esse fato, ainda que fosse declarada nova e inventiva por este examinador, certamente sucumbiria a obstáculos impostos por terceiros em oposição administrativa ou via esfera judicial.
EXEMPLO 2 DE REIVINDICAÇÃO:
REIVINDICAÇÃO COM ESCOPO DE PROTEÇÃO MUITO RESTRITO.
Reivindicação 1: “Furadeira de parede caracterizada pelo fato de que é dotada de uma broca de 20 cm de comprimento, que compreende exatamente 35 diamantes de corte, a furadeira compreendendo uma alça de PVC, um invólucro protetor de baquelite fosco que compreende quatro parafusos de fixação, a furadeira sendo configurada para ser alimentada por uma fonte externa de 110 volts”.
Assumindo que todo o estado da técnica relevante existente para a invenção está representado na figura acima, se levarmos em conta apenas o atendimento ao requisito de novidade (i.e., ignorando o requisito de atividade inventiva) essa reivindicação seria certamente deferida por um examinador de patentes.
Perceba que, conforme elucidado nos dois exemplos acima, existe uma relação inversa entre a extensão do texto de uma reivindicação e o escopo de proteção que ela confere a um objeto. Em outras palavras, regra geral, quanto menor for o texto de uma reivindicação, maior o seu escopo de proteção, por outro lado, quanto maior o seu texto, menor a proteção conferida pela reivindicação. Note-se também que, quanto maior o escopo de proteção de uma reivindicação, menor a probabilidade dessa reivindicação ser futuramente deferida. Inversamente a essa relação, quanto menor o escopo de proteção, maiores as probabilidades de deferimento. A proeza do bom redator de pedidos de patente reside na sensibilidade para saber o que é muito e o que é pouco no que concerne à extensão desse escopo de proteção.
EXEMPLO 3 DE REIVINDICAÇÃO:
REIVINDICAÇÃO COM ESCOPO DE PROTEÇÃO NA MEDIDA CERTA.
Reivindicação 1: “Furadeira de parede caracterizada pelo fato de que é dotada de uma broca compreendida entre 15 e 25 centímetros, a referida broca compreendendo, pelo menos, 10 diamantes de corte”.
Sempre haverá um meio-termo no que se refere aos limites do escopo de proteção conferido por uma reivindicação. Grande demais, a reivindicação será indeferida; pequena demais, a reivindicação não será capaz de proteger o titular contra todas as tentativas de contrafação realizadas por seus concorrentes. Para alcançar com perfeição esse meio-termo, o redator precisará de grande know-how no campo técnico do objeto reivindicado e vasta experiência na elaboração de pedidos de patente.
IMPORTANTE: Durante o trâmite administrativo de um pedido de patente, sempre será possível restringir o escopo de proteção de uma reivindicação independente. Entretanto, em alguns momentos (mais precisamente após o requerimento de exame), não será possível ampliar o escopo de proteção das reivindicações independentes. Por esse motivo, quando houver dúvida quanto à abrangência do escopo de proteção que se deve adotar em uma determinada reivindicação independente, sempre redija esta reivindicação com o escopo de proteção o mais amplo possível. Restrinja paulatinamente esse escopo de proteção durante o processo administrativo do pedido de patente, com apoio das reivindicações dependentes, conforme a opinião e os documentos de técnica anterior apontados pelos examinadores do INPI.
REIVINDICAÇÃO DEPENDENTE
As reivindicações dependentes, tal como pode ser inferido por seu próprio nome, possuem valor apenas quando complementam uma reivindicação independente. Dessa forma, uma reivindicação dependente não pode ser analisada isoladamente e não pode contrariar a reivindicação independente a ela associada, pois seu papel se restringe a complementar as definições contidas em uma reivindicação independente.
Como exemplo, se a reivindicação 1 define uma mesa de madeira, sua reivindicação dependente não pode definir uma mesa de plástico, mas pode definir uma mesa com tampo redondo. Isso porque a informação definida em uma reivindicação dependente nunca pode contrariar a informação da reivindicação à qual essa reivindicação dependente se reporta; entretanto, pode – e deve – complementar o conteúdo da reivindicação independente a ela relacionada.
Neste ponto, cabe salientar que, uma reivindicação dependente também pode ser dependente de outra reivindicação dependente. Em outras palavras, é factível a elaboração de uma reivindicação dependente que se reporte exclusivamente a outra reivindicação dependente.
Exemplo:
- Reivindicação 1: Veículo automotor caracterizado pelo fato de que é feito de aço.
- Reivindicação 2: Veículo automotor, de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que compreende duas portas.
- Reivindicação 3: Veículo automotor, de acordo com a reivindicação 2, caracterizado pelo fato de que cada uma das portas compreende uma janela.
- Reivindicação 4: Veículo automotor, de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que compreende quatro rodas.
PARA QUE SERVE UMA REIVINDICAÇÃO DEPENDENTE?
As reivindicações dependentes são como um banco de reservas em um jogo de futebol. Enquanto a bola está rolando no campo, os reservas não têm nenhum valor prático, mas quando um acidente inesperado ocorre no gramado, um ou mais jogadores reservas entram no jogo, alterando a configuração original de um dos times. Grosso modo, o acidente inesperado que pode trazer utilidade a uma reivindicação dependente é um parecer desfavorável de um examinador de patentes.
Quando um examinador entende que a reivindicação 1 de um pedido de patente encontra-se integralmente antecipada pelo estado da técnica, em resposta a esse parecer negativo, o redator do pedido de patente pode solicitar a subida de uma ou mais reivindicações dependentes.
No exemplo imediatamente acima, do “veículo automotor caracterizado pelo fato de que é feito de aço”, se o examinador encontrou no estado da técnica um carro feito de aço, em sua resposta, o redator poderia ordenar a subida da reivindicação 2. Neste caso, o novo quadro reivindicatório seria:
- Reivindicação 1: Carro caracterizado pelo fato de que é feito de aço e compreende duas portas.
- Reivindicação 2: Carro, de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de cada uma das portas compreende uma janela.
- Reivindicação 3: Carro, de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que compreende quatro rodas.
Se isso não for suficiente aos olhos do examinador, o redator pode subir as reivindicações 3 e 4, restringindo ainda mais o escopo de proteção da reivindicação 1. Por esse motivo, quanto mais reivindicações dependentes um quadro reivindicatório compreender, e quanto mais específico for o conteúdo das reivindicações dependentes, melhor.
Uma boa estratégia ao redigir um quadro reivindicatório é escrever reivindicações independentes com escopo de proteção bastante amplo e genérico e ir restringindo o escopo de proteção do quadro reivindicatório a cada reivindicação dependente acrescentada.
Eventualmente, durante o exame do pedido de patente, o examinador pode rejeitar as reivindicações 1, 2, 3 e 4, mas certamente irá aceitar uma combinação de cinco ou mais reivindicações dependentes.
DICAS PARA A CONSTRUÇÃO DE REIVINDICAÇÕES
Descreva apenas a essência da invenção nas reivindicações independentes. Nas reivindicações independentes, a invenção deverá ser descrita da forma mais sucinta possível, revelando o menor volume de conteúdo que a situação permitir. Todas as características complementares da invenção devem ser deixadas de lado para que sejam apontadas nas reivindicações dependentes do documento.
Assim, a primeira pergunta que o redator deve fazer é: O que é essencial na invenção em análise?
A segunda pergunta que deve ser feita pelo redator é: Como é possível descrever a invenção fazendo uso do menor número de palavras, sem descrever vantagens, resultados e objetivos dessa tecnologia e sem se reportar a comparações com o estado da técnica?
Se a reivindicação for um objeto palpável, uma dica é fazer um desenho à mão, que ilustre cada um dos componentes essenciais da invenção. Cada parafuso, cada pecinha insignificante que o redator conseguir retirar da invenção, sem subtrair dela a sua essência, irá ajudar na redação das reivindicações independentes.
Depois de escrever um rascunho de uma reivindicação independente em um pedaço de papel, o redator deve se perguntar: Será que posso retirar mais algum elemento da reivindicação e deixá-la ainda mais enxuta? Se retirar esse elemento, a reivindicação esbarra no estado da técnica? Lembre-se de que quanto mais amplo for o escopo da reivindicação, melhor; porém, se este escopo for extremamente amplo, ele certamente será indeferido pelo INPI.
REIVINDICAÇÃO DE PROCESSO E DE MÉTODO
Como dito anteriormente, é muito comum que um quadro reivindicatório contenha mais que uma modalidade de reivindicação independente: uma reivindicação independente para um objeto, uma reivindicação independente para o processo de fabricação desse objeto e uma terceira reivindicação independente para o método de utilização desse objeto.
Outras vezes, o foco da própria invenção consiste em um processo de fabricação ou método de utilização de um objeto já conhecido. Nesses casos, é comum a redação de pedidos de patente que compreendam apenas uma reivindicação independente para o aludido método/processo.
Ressalvando os métodos e processos mais simples, que compreendem uma única tarefa, todo método ou processo pode ser descrito como um meio de realização sequencial de tarefas. Da mesma forma, também pode ser o texto das reivindicações de processo e de método.
Exemplo:
- Reivindicação 1: Método para produção de aço a partir de minério de ferro, caracterizado pelo fato de que compreende as seguintes etapas sequenciais:
etapa 1 – extração do minério de ferro em forma de finos;
etapa 2 – aglomeração dos finos do minério de ferro;
etapa 3 – formação de ferro-gusa líquido a partir do produto da etapa 2;
etapa 4 – transformação do ferro gusa em aço.
E quando as etapas principais se subdividem em etapas menores, é possível reivindicar essas etapas menores no quadro reivindicatório? Sim, basta adotar outra forma de sequenciamento, que use letras em vez de números, para encadeamento sequencial das subetapas.
Exemplo:
- Reivindicação 2: Método para produção de metal a partir de minério de ferro, de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que a etapa 2 se subdivide em subetapas, organizadas na seguinte ordem sequencial:
subetapa 2a – moagem;
subetapa 2b – espessamento;
subetapa 2c – filtragem;
subetapa 2d – mistura; e
subetapa 2e – pelotamento.
Pedidos de patente para métodos costumam apresentar fluxogramas operacionais nos desenhos. De todo modo, o art. 8º da Instrução Normativa nº 30 do INPI postula que os fluxogramas devem ser isentos de textos.
Assim, em tese, seguindo à risca as instruções normativas do INPI, as únicas formas de apresentar esses fluxogramas nos desenhos do documento é substituindo os textos dos fluxogramas originais que descrevem o método da invenção por referências numéricas ou imagens representativas das ações contidas em cada etapa reivindicada.
REIVINDICAÇÃO DO OBJETO MAIS AMPLO
Quando a invenção consiste em uma pequena peça, compreendida por um objeto maior, reivindica-se em separado a peça e o objeto maior dotado da referida peça.
Exemplo:
No exemplo acima, em que a invenção consiste em uma alteração em uma vela de ignição, o redator deve construir uma reivindicação independente para a vela de ignição; uma reivindicação independente para um motor à combustão interna que compreende a dita vela de ignição, e uma terceira reivindicação independente para um veículo dotado de um motor a combustão interna que compreende a referida vela de ignição.
QUAL A FINALIDADE PRÁTICA DESSE TIPO DE REIVINDICAÇÃO?
Vamos supor que a patente para a vela de ignição é concedida com apenas uma única reivindicação, que protege apenas a vela de ignição e ignora o motor e o veículo onde ela deve ser instalada.
Nesse caso, vamos supor também que um concorrente do titular da patente produz exatamente a mesma vela de ignição reivindicada na patente. Ocorre que todas as velas de ignição produzidas por esse concorrente já se encontram devidamente instaladas em motores de combustão interna, que, por sua vez, estão devidamente acoplados aos chassis de veículos de passeio.
Nesse tipo de situação, é comum que o titular da patente acione judicialmente o infrator, determinando a imediata suspensão de suas atividades e a apreensão de todas as unidades do produto infrator em estoque. A partir desse momento, um juiz de direito pode determinar a visita de um oficial de justiça às instalações do infrator para tomar providências em relação à apreensão da mercadoria infratora.
Em posse de uma patente que reivindica apenas velas de ignição, pelo menos em tese, o oficial de justiça não teria poderes para abrir cada um dos motores e retirar cada uma das velas de ignição desses equipamentos.
Para facilitar o trabalho desse profissional é preciso que exista uma reivindicação para o motor e/ou para o veículo em sua integridade. É nesse ponto que reside a utilidade de construção de um quadro reivindicatório que compreende reivindicações para a parte e para o objeto mais amplo que compreende a referida parte.
Concluindo, essa estratégia de construção de reivindicações cumpre a finalidade de atribuir maior segurança jurídica ao titular em eventuais contextos litigiosos envolvendo a sua carta patente.
NÃO É ACONSELHÁVEL O USO DE REFERÊNCIAS ESPACIAIS GENÉRICAS COMO: HORIZONTAL, VERTICAL, NORTE, SUL, PARA CIMA E PARA BAIXO a não ser que sejam previamente definidas no texto da reivindicação, essas palavras são praticamente inúteis no que concerne à proteção conferida pela reivindicação. Isso porque um determinado objeto que se apresenta do seguinte modo em um determinado momento:
Pode se apresentar de outro modo em um segundo momento:
Portanto, caso o redator sinta a necessidade de descrever os elementos do objeto utilizando referências espaciais (como horizontal e vertical, por exemplo), ele deve adotar um plano de referência ou uma linha de referência vinculada a determinada porção do objeto.
Exemplo:
Cadeira (1) caracterizada pelo fato de que compreende uma base plana (2), quatro pés (3) e duas hastes de sustentação (4); a base plana (2) definindo um plano horizontal; as hastes de sustentação (4) e os quatro pés (3) emergindo da base plana (2) e definindo um ângulo substancialmente reto com o plano horizontal definido pela base plana (2); as hastes de sustentação (4) e os quatro pés (3) estando orientados em sentidos opostos.
Evidente que, se fizer uso do princípio da equidade, um perito ou um juiz de direito, em sã consciência, não se importaria com esses detalhes. Independente da reivindicação, definir referências espaciais como horizontal, vertical, para cima ou para baixo, infringiria a reivindicação da patente, caso a cadeira do concorrente que, estando posicionada corretamente sobre o solo, se enquadrasse naquela definição. Assim procederiam a maioria dos juízes e peritos que se debruçassem a fundo sobre esse caso.
Contudo, existem duas ressalvas a esse argumento. Em primeiro lugar, o bom redator de patentes deve sempre buscar a maior segurança jurídica possível ao titular da patente. Escrever um quadro reivindicatório escorado em princípio da equidade ou doutrina dos equivalentes não é atitude de um bom redator de pedido de patente. Em segundo lugar, o uso dessas expressões (acima, abaixo, horizontal, etc.) pode gerar exigência fundamentada no artigo 4º, inciso III, da Instrução Normativa nº 30/2013 e no artigo 25 da Lei de Propriedade Industrial.
Por esses motivos, as referências espaciais genéricas devem ser evitadas na construção das reivindicações para objetos palpáveis, de forma física definida.
PREFIRA FORMAS ABERTAS DE DEFINIÇÃO A FORMAS FECHADAS DE DEFINIÇÃO
Regra geral, uma reivindicação deve compreender formas abertas de definição. Formas abertas de definição permitem que o objeto reivindicado compreenda não apenas o que é citado na reivindicação, mas também outras características não mencionadas, que poderiam ser introduzidas no objeto sem desvinculá-lo do escopo da reivindicação.
Exemplos de expressões usadas para criar formas abertas de definição:
- compreendendo; possuindo; incluindo; tendo; abrangendo; englobando; contendo; possuindo, pelo menos; compreendendo, pelo menos; sendo dotado de; e sendo substancialmente [característica].
Exemplo:
- Objeto X caracterizado pelo fato de que compreende um dispositivo A, disposto em sua face superior.
A reivindicação acima define que o objeto não se limita à compreensão do dispositivo A, outros dispositivos e mecanismos também poderiam estar compreendidos pelo objeto X.
Formas fechadas de definição também podem ser usadas. De todo modo, sempre que usar as formas fechadas de definição o redator tem de ter plena consciência de que estas restringem sobremaneira o escopo de proteção da reivindicação.
Exemplos de expressões usadas para criar formas fechadas de definição:
- consistir de; consistir em; compreendendo apenas; contendo apenas; e tendo apenas.
Exemplo:
- Veículo automotor compreendendo apenas duas rodas, caracterizado pelo fato de que é dotado de um motor a combustão interna.
A única situação em que as formas fechadas de definição são mais recomendadas que as formas abertas de definição é quando o redator necessita desviar a matéria definida na reivindicação dos objetos compreendidos pelo estado da técnica.
USO DA EXPRESSÃO “MEIOS PARA”
Utilize essa expressão como uma forma genérica de descrever um conjunto de elementos.
Exemplo:
1. tênis caracterizado por ser dotado de sola e um meio para fixação da sola.
2. tênis de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que o meio de fixação é um velcro®.
3. tênis de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que o meio de fixação é um adesivo.
4. tênis de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que o meio de fixação é uma costura.
(Exemplo elaborado com base no item 3.10 das diretrizes de exame do INPI de 2012).
A expressão “meio para” confere uma definição genérica a um elemento a ser especificado logo em seguida. No exemplo ilustrado acima, o “meio para” pode significar: um velcro®, um adesivo ou uma costura. Ao fazer uso dessa expressão, o redator opta por uma forma de definição aberta.
USO DE SUBSTANCIALMENTE
A palavra substancialmente é um verdadeiro coringa nas mãos de redatores de patentes. Essa expressão sempre precede um adjetivo e invariavelmente seu objetivo consiste na ampliação das margens de definição desse adjetivo.
Exemplo:
- substancialmente plano: plano, porém um pouquinho abaulado não foge à definição;
- substancialmente reto: reto, porém um pouquinho curvo não foge à definição;
- material substancialmente metálico: um material que compreende grande parte de sua estrutura um elemento metálico (pode ser um material compósito, que combina metal e polímero, por exemplo).
Faça uso dessa expressão sempre que possível, buscando ampliar as definições adotadas no texto das reivindicações.
ANTEVENHA-SE À ESTRATÉGIA DE DESIGN-AROUND DO CONCORRENTE
Quando um pedido de patente de um determinado titular é publicado, é comum que os concorrentes desse titular analisem o quadro reivindicatório desse documento e busquem formas de driblar o escopo de proteção por ele determinado. Esta estratégia, de driblar o quadro reivindicatório tentando reproduzir algo similar à tecnologia objeto da patente, é denominada design-around. Um exemplo ilustrativo de design-around é revelado a seguir:
Se o quadro reivindicatório reivindica uma embarcação dotada de um casco de alumínio, um concorrente pode testar, em um laboratório, outros metais que poderiam ser utilizados para construção do mesmo casco, alcançando resultados similares. Por esse motivo, assim que termina de elaborar um quadro reivindicatório, o redator tem de se submeter ao exercício de enxergar a invenção como se fosse um concorrente do titular do pedido de patente, questionando:
- Como esse concorrente poderia driblar o quadro reivindicatório?
- Há como o concorrente driblar o quadro reivindicatório?
- Existe algum componente, alguma peça reivindicada, que possa ser substituído por um elemento similar que promova resultados parecidos, mas que não se enquadre nas definições da reivindicação?
(essas perguntas devem ser feitas a todo momento durante a elaboração do quadro reivindicatório)
Se a resposta para essas perguntas for sim, o quadro reivindicatório terá de ser reescrito; se for não, é bem provável que o quadro reivindicatório esteja pronto e finalizado.
ESCREVA REIVINDICAÇÕES QUE FACILITEM A PROVA PERICIAL.
Existe um brocardo jurídico no direito penal, bastante familiar aos operadores do direito, que diz o seguinte: in dúbio pro reo.
Essa expressão retrata o princípio jurídico da presunção da inocência. Aplicando esse princípio à seara das ações de infrações de patentes no plano penal: na dúvida, se não restar comprovado categoricamente que houve infração em um determinado caso, não há condenação do suposto infrator. Isso implica que cada reivindicação tem de ser uma armadilha certeira, que aprisione o infrator dentro dela e não dê margens a dúvidas de que ele é realmente um infrator.
Um exemplo mais concreto pode ilustrar melhor esse tipo de situação:
- Reivindicação 1: Anel de pistão de substrato metálico
que compreende quatro faces planas, sendo uma face
radial interna, uma face radial externa e duas faces
laterais, caracterizado pelo fato de que sua face radial
externa foi submetida a um processo de pulverização
catódica de íons de titânio.
No exemplo acima, é dito na reivindicação que a face externa do anel de pistão foi submetida a um processo de pulverização catódica. Em sua defesa, um eventual infrator poderia alegar que, apesar do anel de pistão conter titânio em sua face externa, esse elemento químico não foi inserido na face externa do pistão mediante realização de um processo de pulverização catódica. Assim, o mais adequado para a situação do exemplo acima seria a construção de um quadro reivindicatório que contivesse uma reivindicação de processo e uma reivindicação de produto; a reivindicação de produto não se remetendo, em momento algum, ao processo:
- Reivindicação 1: Anel de pistão de substrato metálico que compreende quatro faces planas, sendo uma face radial interna, uma face radial externa e duas faces laterais, caracterizado pelo fato de que sua face radial externa compreende uma camada de espessura de X mm de titânio que revela um nível de adesão Y ao substrato do anel.
- Reivindicação 2: Processo de fabricação de anel de pistão dotado de uma face radial externa, caracterizado pelo fato de que compreende uma etapa de pulverização catódica de íons de titânio sobre a face radial externa do anel.
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