Quando falamos sobre propriedade intelectual é importante entender o que é domínio público e como este pode ser um impeditivo para quem pretende proteger novas tecnologias. Além disso, é necessário entender o que ocorre quando alguém utiliza a tecnologia protegida por um terceiro, antes do depósito de um pedido de patente, sendo essa pessoa chamada de usuário anterior. Esse artigo abordará esses tópicos, explorando os efeitos do domínio público e usuário anterior sobre o direito de patentes no Brasil.
O que é domínio público?
Domínio público pode ser definido como a condição jurídica na qual a invenção não possui mais direito de propriedade individual, não havendo nenhuma restrição para sua venda, fabricação, uso, importação, exportação e fabricação.
Sobre esse tema, a doutrina cita que:
“O ingresso no domínio público em cada sistema jurídico é incondicional, universal e definitivo; a criação passa a ser comum de todos, e todos têm o direito de mantê-la em comunhão, impedindo a apropriação singular.” (página 50 do livro Criações Industriais, Segredos de Negócios e Concorrência Desleal, (Barbosa, Ahlert, Labrunie, Moro, & Jabur, 2007))
Nesse trecho da doutrina fica claro que quando uma invenção entra no domínio público, esta já não pode mais se tornar domínio privado. Com efeito, qualquer pedido de patente de invenções idênticas ou similares àquela publicamente divulgada não poderá ser concedida. Visto que tais pedidos não cumpririam com os critérios de novidade e atividade inventiva.
Sendo assim, é possível concluir que toda invenção que for publicamente divulgada faz parte do estado da técnica. Portanto, referida invenção poderia ser vendida, fabricada, utilizada, importada, exportada ou fabricada por qualquer pessoa ou empresa que tenha interesse.
Exceções
No entanto, nem toda divulgação implica em entrada em domínio público. No caso de publicação de pedido de patente, apesar de ter sido divulgada, a invenção faz parte de um domínio privado do titular do pedido de patente. Dito isso, é importante ressaltar que uma vez expirado o período de vigência essa invenção se torna domínio público.
Outra exceção ocorre quando são divulgadas informações sobre uma invenção nos 12 meses que antecedem o deposito de um pedido de patente. Esse período é o que se conhece como período de graça. Ou seja, mesmo que um inventor divulgue publicamente informações sobre seu invento, a este ainda é garantido o direito de depositar um pedido de patente sobre tal invento sem que a informação divulgada integre domínio público.
O que é usuário anterior?
É considerado usuário anterior todo aquele que já utilizava uma tecnologia antes do depósito de uma patente reivindicando essa tecnologia. Referido usuário tem o direito de seguir usufruindo-se daquele invento (processo ou produto). Tal direito é garantido pelo Art. 45 da lei, transcrito abaixo:
“Art. 45. À pessoa de boa fé que, antes da data de depósito ou de prioridade de pedido de patente, explorava seu objeto no País, será assegurado o direito de continuar a exploração, sem ônus, na forma e condição anteriores.
1º O direito conferido na forma deste artigo só poderá ser cedido juntamente com o negócio ou empresa, ou parte desta que tenha direta relação com a exploração do objeto da patente, por alienação ou arrendamento.
2º O direito de que trata este artigo não será assegurado a pessoa que tenha tido conhecimento do objeto da patente através de divulgação na forma do art. 12, desde que o pedido tenha sido depositado no prazo de 1 (um) ano, contado da divulgação.”
Levando em conta o Art. 45 da Lei 9279/96, podemos concluir que a pessoa que usufruía de uma tecnologia antes do seu depósito de patente pode continuar fazendo-o desde que não mude a forma e a condição de tal exploração. Definindo que a exploração deve ocorrer na “condição anterior”, pretende-se colocar a não expansão ou alteração do nível de produto ou processo feitos anteriormente. Nesse sentido, um usuário anterior não poderia, por exemplo, expandir o território de exploração.
A exceção do Art. 45 está descrita no § 2º do próprio artigo, ocorrendo em casos de o usuário anterior ter utilizado o material divulgado pelo próprio inventor ou depositante antes do depósito da patente. Nesse caso não existe o direito de usuário anterior, visto que o inventor estaria ainda protegido pelo período de graça.
Usuário anterior caracteriza, necessariamente, domínio público?
Afirmar que a existência de um usuário anterior caracteriza a perda de novidade e atividade inventiva faz sentido. No entanto, esse pensamento não leva em conta a possibilidade de um usuário anterior fazer uso da invenção em regime de segredo industrial. Nesse caso não ocorre divulgação pública, de modo que a invenção não passa a ser domínio público nem estado da técnica. Isso é explicado pelo parágrafo 1 do Art. 11:
“§ 1º O estado da técnica é constituído por tudo aquilo tornado acessível ao público antes da data de depósito do pedido de patente, por descrição escrita ou oral, por uso ou qualquer outro meio, no Brasil ou no exterior, ressalvado o disposto nos arts. 12, 16 e 17.”
A luz do trecho acima, é possível concluir que aquilo que não está divulgado não faz parte do estado da técnica, logo segredos industriais não estão no estado da técnica.
No entanto, caso exista um usuário anterior público de uma patente concedida, essa patente não teria novidade, pois já estava contemplada em domínio público. Logo, tal patente teria sido indevidamente concedida pelo INPI.
Conclusão
Levando em conta o exposto neste artigo, podemos perceber que os conceitos de domínio público e usuário anterior possuem uma relação importante sobre os direitos de patente. É sempre bom ter em mente as condições de entrada de uma invenção em domínio público e os direitos de um usuário anterior. Saber desses efeitos é importante para saber se seu invento é patenteável e, se você for um usuário anterior, evitar abuso de direito de patentes de terceiros.