Escrito por Katherine Rosman
(tradução livre de oconsultorempatentes.com)
Em um dia ensolarado de verão em Montauk (uma cidade praiana no estado de Nova York), Ipek Irgit se encontrava reflexiva, sem saber o que fazia com sua própria vida. Era 2012 e ela tinha 34 anos. No início daquele ano, logo após enfrentar uma desilusão amorosa, ela tirou férias no Brasil, visitando o Rio de Janeiro e o litoral da Bahia. Agora ela estava na praia de Long Island, usando um biquíni feito à mão com crochê e tiras elásticas expostas, tentando descobrir o que fazer da própria vida.
Passaram onze anos desde que Irgit mudou-se da Turquia para Nova York, com 300 dólares no bolso e um sonho vago de fazer uma vida em uma das indústrias criativas da cidade. Ela se tornou parte da elite formadora de opinião onde todos pareciam ter um propósito. Era uma vida muito cara, especialmente para Irgit, que, desprovida de grandes reservas financeiras, pulava de emprego em emprego. Ela foi garçonete e empregada de bar; trabalhou para uma empresa de moda como assistente de merchandiser e no departamento de vendas em atacado. Nenhuma das alternativas vingou.
Na areia de Montauk, Irgit estava jogando frescobol com um amigo, o dono de restaurante Serge Becker, quando ele elogiou o impressionante biquíni dela. Como a Irgit disse mais tarde, essa foi a faísca que a motivou a começar um negócio. Por que não criar mais desses trajes de banho distintos? Por que não se tornar uma criadora de biquínis?
Irgit olhou para o maiô e viu “superpoderes” inexplorados. Era brilhante, colorido e parecia fantástico no Instagram. Sua forma minúscula continha uma matriz inesperada de elementos: painéis triangulares; cores contrastantes na costura; e mais distintamente de todos, as correias elásticas vibrantes rosqueadas através de loops de crochê. A vestimenta tinha um toque de feito-em-casa (N.T. Do-It-Yourself sensibility) sendo popular na Internet e na pista e Irgit esperava que os compradores iriam vê-la como sexy, porém, esportiva, boêmia, mas, sofisticada. Uma fotografia de sua própria personalidade (nas palavras de Irgit).
Irgit pediu a um amigo na indústria da moda para criar um protótipo, e uma fábrica na China fez um lote a um custo de cerca de 29 dólares por peça. Irgit decidiu vendê-los nos varejo a 285 dólares, colocando sua vestimenta no mercado de alto luxo. Ela prestou atenção cuidadosa à marca, brincando com “Bikini” e suas iniciais — I.I.I. — formando a marca “Kiini” com um logotipo com três triângulos sobre cada “i”, como os painéis na parte superior e inferior de seu biquíni.
Em junho de 2013, Kiini teve sua festa de lançamento em um restaurante badalado de Propriedade do Sr. Becker (o parceiro de frescobol de Irgit). Modelos, estilistas e outros membros estralados beberam cerveja caribenha e posaram para fotos com a Sra. Irgit, que usava batom brilhante e um macacão estilo piloto desabotoado quase ao umbigo, revelando seu Kiini abaixo do macacão.
As vendas não passaram de regular até o mês de Janeiro, quando o produto de Irgit recebeu seu primeiro post significativo no Instagram. A modelo Dree Hemingway posou provocativamente sobre uma prancha de surf vestindo o biquíni. Na legenda da foto: “Obrigado pela meu Kiini!”
“Eu estava em êxtase,” disse Irgit. “Era o que faltava!”O biquíni foi destaque na Vogue.com, e na revista Vogue UK e Women’s Health. Também apareceu na Elle Italia, a revista de estilo do The Sunday Times of London e no Coveteur.Em junho de 2014, a revista People o apelidou de “the hottest bikini this summer” (o biquíni mais transado deste verão). Naquele dezembro, ele apareceu na capa do Reino Unido da Condé Nast Traveller. Poucos meses depois, a empresa anunciou que o biquíni estava disponível na Barneys, a maior referência no varejo de marcas marcas de luxo do mundo.
As vendas explodiram. Em 2015, o biquíni de Irgit tinha faturado aproximadamente 9 milhões de dólares, segundo Sally Wu, que por anos ajudou na parceria com as fábricas chinesas encarregadas da manufatura do biquíni.
Como é frequente no mundo da moda, o sucesso de Kiini atraiu imitações. A Sra. Irgit reclamou com seu advogado, que a aconselhou a protocolar o desenho da peça junto ao escritório de direitos autorais dos Estados Unidos.
Irgit tratava os fabricantes piratas com muita rivalidade. Ela borbulhava de ódio ao ver imagens do Instagram que erroneamente se referiam aos impostores de Kiinis, e até mesmo contratou uma empresa para apagar posts com a hashtag #Kiini que não exibisse o verdadeiro Kiini. Certa vez, Irgit disse a um site de moda que “um dos meus grandes desafios tem sido acompanhar a demanda sem perder a integridade e contratar as pessoas certas para ajudar sem entrar em pânico. Meu maior desafio agora são as copiadoras ao redor do mundo. As pessoas dizem que eu deveria estar lisonjeada, mas eu desprezo todos eles. Para mim isto apenas revela uma face muito feia da humanidade.”
A MENOR VESTIMENTA PODE ESCONDER MUITOS SEGREDOS
No mundo da moda, há uma linha tênue, às vezes indistinguível, que separa inspiração e o roubo. A maioria das empresas de vestuário costuma não dar muita atenção a itens que são derivados de suas vestimentas. O ciclo de tendências se move tão rapidamente que os especialistas tendem a acreditar que o melhor uso dos recursos não é o litígio, mas a criação dos estilos da próxima temporada.
Irgit, no entanto, não conseguiu aceitar a ideia de versões rivais de biquínis de crochê coloridos. Em 2015, ela ficou particularmente inflamada com a introdução de um falso Kiini feito pela Victoria’s Secret. Em outubro daquele ano, no distrito central da Califórnia, seus advogados entraram com uma ação que acusava essa empresa de violação de direitos autorais. A petição inicial convocava a Victoria’s Secret a parar de vender a roupa de banho e a pagar uma indenização a Irgit.
O poder das partes no litígio era muito desproporcional — a pequena Kiini de um lado e a gigante Victoria’s Secret do outro — mas Irgit estava com a faca nos dentes. Em determinado momento, ela secretamente gravou uma reunião com um ex-designer de roupas de banho da Victoria’s Secret. Então os advogados de Kiini depuseram o designer; quando seu depoimento contradisse o que estava na gravação, a parte contrária contra-atacou, criando um momento dramático e constrangedor para Irgit. À medida que o litígio se arrastava, a Victoria’s Secret decidiu sair completamente do negócio de trajes de banho e, em março de 2017, esta empresa e Kiini formalizaram um acordo confidencial. (Victoria’s Secret se recusou a comentar.)
Irgit se sentiu vitoriosa. Um ano depois, em abril de 2018, Kiini entrou com outra ação na justiça, desta vez no Distrito Sul de Nova York, contra Neiman Marcus e duas fabricantes de biquíni. Acusou-os de concorrência desleal, por enganar os consumidores sobre a origem dos trajes de banho e violar o trade dress de Kiini. Em termos leigos, Kiini estava dizendo que qualquer consumidor no mundo que visse um biquíni de crochê e elástico exposto assumiria que este era um biquini da Kiini.
Para uma startup do mundo da moda, é muito raro encontrar uma empresa desse porte entrando com ação de infração contra terceiros. Ingressar com um segundo litígio, é inédito. A litigiosidade de Kiini atraiu a atenção indesejada para sua fundadora, Irgit – e revelou que até mesmo a menor peça de vestuário pode esconder muitos segredos.
Um dia em agosto, Irgit me recebeu em um loft no bairro de Tribeca (NY), um espaço amplo e arejado que serve tanto como sua casa quanto como o showroom e o escritório de Kiini. Nós nos sentamos em uma mesa de cozinha longa e retangular que separa a área de estar e o espaço de trabalho. É motivo de orgulho para Irgit que ela tenha usado seu próprio conhecimento de marketing para desenvolver o perfil da Kiini sem o uso de um publicitário, mas nossa entrevista ocorreu sob condições específicas negociadas por Risa Heller, uma consultora de comunicações de crise.
Enquanto conversávamos, a Sra. Irgit compartilhava seu desdém pelo processo legal – uma aversão a processos judiciais e a crença de que os advogados são os que mais se beneficiam deles. Era o processo criativo que ela mais apreciava, ela disse. Contudo, ela divagou bastante quando perguntei repetidamente para falar sobre o processo de criação do Kiini. Ela mesmo que desenhou? Como surgiu a ideia de enfiar o elástico no crochê?
“Isso vem da minha avó“, disse Irgit, em sua resposta mais específica.
“Costumávamos fazer coisas como biquínis de crochê, na época eu tinha entre 10 e 11 anos.“
“Você fez biquínis de crochê quando tinha 10 anos?“, Perguntei.
“Não eu, eu não estou fazendo isso agora, correto?” Disse Irgit. “Não. ‘Fazer’ é como… normalmente é minha ideia. Mas eu não os fiz. Minha mãe fez isso, ou minha avó que fez.”
E sobre o traje de banho que Irgit estava usando na praia de Montauk em 2012 com o Sr. Becker? Quem fez isso? “Eu pedi para que fizessem para mim“, era tudo o que Irgit se propôs a falar.
Liguei para o Sr. Becker, seu parceiro de frescobol.
Ele lembrou-se do momento muito bem. “Ela estava vestindo-o“, disse o Sr. Becker. “Eu notei isso e eu disse que era muito legal. Ela me disse que tinha encontrado no Brasil e estava pensando em começar a fazer algo com ele em diferentes variedades.“
“EU CRIEI ESTE BIQUÍNI PARA SOBREVIVER”
Maria Solange Ferrarini vive em Trancoso, Bahia, ao longo de uma estrada de terra repleta de lixo e animais vadios. Quando eu caminhava até sua casa arrumada de quatro quartos um dia neste verão, ela me cumprimentou vestida de shorts de malha com elásticos brilhantemente coloridos tecidos através deles. Debaixo de uma camiseta sem mangas, ela usava um top de biquíni similar.
Dentro da casa, enquanto conversamos com a ajuda de um tradutor, Maria Solange pegou um novelo preso através de uma agulha. Ela tinha o hábito de agarrá-lo e fazer crochê automaticamente, sem que tivesse consciência do movimento de suas mãos. Segurando o novelo quase como um terço de oração, como ela contou sua história.
Maria Solange, 61 anos, descreveu-se como uma artista de rua, mas a maioria das pessoas em Trancoso a conhece como a senhora dos biquínis. Desde 1998, ela tem vendido biquínis de crochê e elástico na praia, andando para cima e para baixo da areia com suas criações penduradas em um bambolê. Ela e o biquíni são inseparáveis. “É o meu marido“, disse ela, com uma risada.
Eu olhei para um dos biquínis em sua sala de estar. O padrão do biquíni da Maria Solange tem dois triângulos escuros de denim conectados por pontos visíveis de rosca de bordado para alças de crochê com elásticos brilhantemente coloridos tecidos através deles. O fundo é feito para corresponder. É praticamente idêntico ao biquíni que Irgit alegava ter direitos autorais sobre.
“Eu criei este biquíni para sobreviver“, disse Maria Solange. Ela nasceu em São Carlos, SP, onde seu pai era um pedreiro e sua mãe era uma costureira. Quando ela tinha 10 anos, sua mãe a ensinou a crochê para que ela pudesse fazer roupas para si e para suas irmãs mais novas. Em torno de 1994, ela se mudou para Trancoso, tomou um quarto em uma casa de hóspedes, e tentou ganhar dinheiro com seu ofício. Ela fazia biquínis fio dental de crochê e vendia-os na praia.
Maria Solange era nudista, o que lhe trouxe um problema. Para voltar à casa de hóspedes no final do dia, a Sra. Ferrarini teve que passar por uma igreja à beira-mar. Como católica, ela não se sentia bem em passar pela igreja vestindo apenas um biquíni fio dental e com seus seios a mostra. Em reverência, ela acrescentou a sua vestimenta um top do tipo cortina enrolado sobre os seios. O projeto evoluiu em um top de biquíni.
Quando Maria Solange percebeu que precisava de mais apoio do que o fio poderia fornecer, ela começou a costurar elásticos através do crochê para dar um pequena sustentação ao biquíni. Outras mulheres rapidamente observaram a nova característica. Elas pediram-lhe para fazer tops para elas, também. Inicialmente, ela vendeu os biquínis pelo equivalente a 2.50 dólares, cada. Ela foi aumentando o preço por cerca de cinco dólares a cada par de anos.
A economia turística de Trancoso estava ganhando vapor em meados de 2009. Naquele ano, a Vogue a chamava de “cidade de praia mais badalada do Brasil”, relatando que era uma das favoritas da topmodel Gisele Bündchen. Era o tipo de praia que as pessoas famosas e outros tipos da moda procuram. No inverno de 2012, o Daily Mail publicou fotos da celebridade britânica Kelly Brook na praia de Trancoso, vestindo um dos biquínis da Sra. Ferrarini.
Foi por volta dessa época que a cidade foi visitada por outro trendsetter: Ipek Irgit. Ela confirmou a visita durante a nossa entrevista.
Antes de sair de Trancoso, acompanhei a Sra. Ferrarini em uma caminhada de vendas ao longo da praia. Conseguiu uma venda com uma mulher da Califórnia e vendeu um top a outra turista do Canadá, que mencionou que tinha visto o mesmo estilo “em todo local“.
à esquerda o biquíni de Ferrarine (Trancoso); à direita o biquíni de Irgit (NY)
Maria Solange suspirou. Ela estava acostumada a isso, ela disse, mas ainda está mordida. Para ela, uma artista, trata-se de uma questão de integridade criativa. “Eu via as pessoas de biquíni, e os estrangeiros duvidavam que eu era a criadora deles“, disse Maria. “Eles diziam que o biquíni era americano. Na minha cara!“
“ESCUTA, IPEK, EU NÃO VOU MENTIR.”
Sally Wu estava feliz em meados de 2012, no dia em que sua amiga, Irgit, contactou-a para pedir um favor. “No início daquele ano, ela tinha viajado o Brasil”, disse Sally, e estava em casa com um biquíni novo. Sally Wu disse que a Irgit disse a ela, “Eu preciso descobrir como copiá-lo.“
Sally Wu era uma boa pessoa para perguntar. Criada em Xangai, ela se mudou para Nova York para se tornar um designer de moda, em seguida, foi para a indústria de “Private Label”, trabalhando como um desenvolvedora de produto e como uma ponte entre as marcas americanas e as fabricantes chinesas. Ela entendia de design, produção e importação.
Na lembrança de Sally Wu, Irgit trouxe um biquíni para seu apartamento em Chinatown e o colocou em um sofá. Sally Wu viu que a peça de vestuário, especialmente o topo, seria mais complexa para reconstruir do que um leigo poderia imaginar. Seria complicado para o fio, por exemplo, manter sua estrutura e cor ao ser regularmente submergido na água. E a tela do biquíni precisaria atender a uma determinada espessura, ou então seria seria parcialmente translúcida. Ela revelou a Irgit cada etapa do processo de replicação.
“Ela não é uma designer“, disse a Sally Wu sobre Irgit neste verão, enquanto nos sentamos no terraço de volta de sua casa atual, em East Harlem. “Mas ela é uma boa comerciante. Ela sabe como criar uma marca, e ela realmente sabe como comercializar um produto.“
Após sua consulta inicial, Sally Wu pediu a Irgit para lhe enviar um documento de especificações que Sally Wu poderia transmitir a um fabricante chinês. Irgit enviou o e-mail em 28 de julho de 2012. “Querida Sally”, começou, e referiu Sally Wu para fotos anexadas, com medições e cores anotados.
Trabalhando com a fábrica, Sally Wu ajudou a criar um protótipo. Irgit adorou, e pediu mais 300. Sally Wu estava preocupada com uma ordem tão grande; se eles não vendessem, Irgit perderia um bom dinheiro. Mas os Kiinis venderam e venderam muito. O que começou como um favor para Irgit tornou-se um grande dispêndio de tempo. “Mesmo no inverno, nós estávamos enviando para a Austrália, enviando para a Europa, enviando para Nova York“, disse Sally Wu. Irgit estava louca tentando gerenciar a demanda comercial e a atenção da imprensa.
As duas mulheres foram consumidas pelo trabalho, e seu relacionamento estava se desgastando. Sally Wu instou Irgit a expandir sua marca além de um único item. Ela fez sugestões que Irgit ridicularizou. Dada a relação deteriorada entre asa duas Sally Wu foi surpreendida, ela disse, ao receber uma ligação de telefone de Irgit uma noite no verão de 2016.
“Posso passar aí?” Irgit perguntou.
Cerca de meia hora depois, ela chegou. Ela estava quase a um ano em litígio com Victoria’s Secret e explicou que no decorrer do processo, os advogados de Victoria’s Secret haviam descoberto que Sally Wu tinha uma mão na produção de Kiini. Os advogados da Victoria’s Secret tinham dado aos advogados de Irgit um aviso prévio de que a Sally Wu ia receber uma intimação para um depoimento.
Sally Wu disse que claramente lembrava o que Irgit lhe disse: “Ela me disse algo do tipo: ‘você não pode dizer-lhes que eu copiei’’. Eu respondi, “Ouça, Ipek, eu não vou mentir.” (Irgit contrapôs a lembrança de Sally Wu: “É uma mentira“, disse ela.)
As duas mulheres falaram um pouco mais. Sally Wu estava chateada por ter sido envolvida em um embroglio jurídico. Irgit estava preocupada sobre como o drama poderia impactar a produção de Kiini.
De acordo com Sally, antes de Irgit partir esta última escreveu uma frase em um bloco de post-it. Na folha de post-it se lê: “se Kiini LLC ganha o caso VS Ipek está tratando” – “Sally e três amigos de férias em qualquer lugar do mundo!“. Ela assinou “Ipek”, sublinhando o nome dela.
Sally Wu disse que nunca recebeu uma intimação. No ano seguinte, Victoria’s Secret estabeleceu o processo com Kiini.
Em abril de 2018, por volta da época em que Kiini processou a Neiman Marcus, a amizade e os negócios de Sally Wu e Irgit se deteriorou completamente. Elas brigaram por e-mail, com cada mulher contestando a integridade da outra, e em seguida, Wu parou de trabalhar com Kiini.
Não muito tempo depois, Sally Wu jantou com um amigo, um empresário chamado Doug Schmidt. Ela contou a ele toda a história sobre seu trabalho com Irgit: replicando o primeiro biquíni brasileiro, os direitos autorais, os processos. Schmidt disse a Sally Wu que tinha amigos em Neiman Marcus e que apostava que seus amigos gostariam de ouvir a história dela.
O ADVOGADO OLHOU MAIS DE PERTO. OLHOU AINDA MAIS FUNDO. E ENTÃO ELE VIU!
Jason Forge foi por muitos anos um promotor federal dos United States attorney’s offices na Califórnia, investigando políticos corruptos e funcionários corruptos da C.I.A.. Agora ele está em seu escritório particular; em seu caso mais notável, ele representou os alunos em uma ação coletiva contra a Trump University, ganhando 25 milhões de dólares. Além disso, Forge é casado com uma proprietária de um fornecedor de roupas de banho chamada PilyQ, que faz um biquíni de crochê que se parece muito com um Kiini. Sob uma marca chamada Platinum, a PilyQ tem vendido há algum tempo essa peça de vestuário para a Neiman Marcus.
Em abril, advogados da Kiini enviaram uma carta a Neiman Marcus pedindo que parasse de vender trajes de banho de marcas como a Platinum. Neiman Marcus notificou a PilyQ, controladora da Platinum, e Forge começou a pesquisar em nome da PilyQ. Ele entrou em contato com advogados envolvidos no litígio da Victoria’s Secret e ouviu rumores de um fabricante de biquínis não reconhecido no Brasil.
Na internet ele encontrou um vídeo feito por um amigo da Sra. Ferrarini em 2016 que exibia seu número de telefone. Forge chegou à Ferrarini, que consultou um advogado, e rapidamente negociou um acordo de não-exclusividade. Em maio, em troca de usar seu projeto de crochê e elástico e seu nome, PilyQ pagou à Sra. Ferrarini o equivalente a cerca de 5100 dólares. (Em janeiro de 2019, ela vai receber uma taxa anual de cerca de 7700 dólares). Neiman Marcus e outros grandes varejistas agora vendem um biquíni com o nome “Platinum Inspired by Solange Ferrarini” por cerca de 170 dólares.
Neste verão, Forge estava muito empolgado de saber com alguém do Neiman Marcus que havia uma mulher chamada Sally Wu, que tinha trabalhado com a Irgit desde o início. Forge convidou Sally Wu para um drink e obteve a sua história. Ela posteriormente enviou-lhe uma foto do post-it amarelo com a oferta assinada da Irgit. Ela também concordou em dar ao Dr. Forge acesso aos dados de seus velhos discos rígidos.
Em poucos dias, ele estava olhando para o e-mail “Querida Sally” que Irgit havia enviado para Sally Wu cerca de seis anos antes, com fotografias do biquíni, que ela desejava que os fabricantes chineses utilizassem como referência para o seu protótipo. Em seu computador, Forge examinou as fotos para obter maiores detalhes. Uma imagem era da parte inferior do biquíni girada para fora.
Forge deu um zoom na imagem. Deu um segundo zoom. Então, ele viu! “Eu não podia acreditar em meus olhos”, disse o Dr. Forge. No elástico, no marcador, estava um número de telefone, as palavras “Trancoso, B.A.” e a assinatura de Solange Ferrarini.
“Se for verdade, é de tirar o fôlego”
Em maio de 2018, como Forge estava conduzindo seu trabalho, Kiini emendou seu processo contra Neiman Marcus para adicionar formalmente PilyQ, Bloomingdales, Lord & Taylor, Macy’s e outros como réus. O Dr. Forge achou ultrajante. A maneira como ele viu, PilyQ estava compensando a Sra. Ferrarini para a sua criação — e agora estava sendo processado por alguém que ele acreditava que tinha copiado esse trabalho e protocolado como seu próprio trabalho no Escritório Americano de Direitos Autorais.
Forge contatou a advogada que tinha trabalhado no caso Victoria’s Secret vs Kiini, Michelle Rutherford, e pediu-lhe para assumir um novo cliente. Em 13 de junho, em nome da Sra. Ferrarini, a Dra Rutherford processou a Sra. Irgit e Kiini no Tribunal Federal, no distrito central da Califórnia, citando práticas comerciais injustas e pedindo um pedido de desculpas público.
Em 3 de julho, um dos advogados de Irgit, citando “diferenças irreconciliáveis”, peticionou o tribunal para ser retirado de seu papel como advogado em seu caso contra Neiman Marcus e os outros. Em 6 de julho, a Irgit retirou seu caso.
Mark A. Berman, advogado de Irgit no caso em que esta é a Ré, peticionou para se demitir e ter a Sra. Rutherford desclassificada. O juiz, Fernando Olguin, que também supervisionou a ação de Kiini contra o Victoria’s Secret, ainda não se manifestou.
Ainda não está clara quais as implicações do novo processo para Irgit. David J. Christopher, chefe de operações do Escritório de Direitos Autorais dos Estados Unidos, não quis comentar.
Mas as alegações são notáveis para outros peritos em direito de propriedade intelectual. “O papel da verdade em nosso sistema judicial é central”, disse Jeanne M. Heffernan, um parceiro no escritório de advocacia Kirkland & Ellis. “Aqui você tem uma mulher que parece ter tomado a propriedade intelectual de outra pessoa e registrou-a como se sua fosse, e, em seguida, ao que parece, teve a audácia de processar uma indústria inteira sobre algo que ela não criou e pode ter roubado. Se for verdade, é de tirar o fôlego. Eu acredito que a Victoria’s Secret queira dar uma segunda olhada em seu acordo.
Quando eu falei com Irgit em seu apartamento no bairro de Tribeca (NY) neste verão, ela disse que não estava preocupada com o caso e estava tentando se concentrar em sua empresa. As vendas não são o que foram durante 2015 e 2016, mas Irgit está desenvolvendo novos produtos, incluindo trajes de banho para as meninas.
Quanto às alegações do processo, Irgit disse que enviou fotos do biquíni da Sra. Ferrarini para a Sra. Wu em 2012, porque ela gostou das cores.
Ela disse que a razão pela qual uma fotografia de um distinto carrinho de abacaxi de Trancoso tinha aparecido em uma versão inicial do site do Kiini era simplesmente porque “era uma foto bonitinha”.
Ela não tinha muito a dizer sobre por que o maiô mostrado em uma fotografia submetida ao escritório de direitos autorais é uma réplica quase igual ao biquíni da senhora Ferrarini.
Ela disse que a nota prometendo a Sally Wu uma recompensa caso houvesse um veredicto favorável do tribunal não era um suborno.
Em um dado momento durante a entrevista, a Irgit entrou em outra sala e retornou com o que ela considerou a evidência de que ela criou o projeto que se tornou o Kiini. Foi um biquíni feito no estilo Ferrarini/Kiini, com elástico tecido através de crochê costurado —- acolchoado com tecido rosa com bolinhas amarelas. O biquíni, disse ela, foi feito em 1999 e tinha permanecido na casa de sua tia, na Turquia, até recentemente.
A Sra. Irgit recusou-se a ser citada diretamente em uma série de tópicos.
No mês passado, no entanto, ela me enviou um e-mail destilando sua raiva com a Sra. Wu. Ela estava ainda mais irritada com PilyQ e Mr. Forge, a quem ela chamou de “bully” e de “lixo”.
“O que eles dizem aos seus filhos na mesa de jantar sobre como eles fazem dinheiro?” Irgit escreveu, dizendo que ela os imaginou como personagens de filmes como o Dr. Evil, de “Austin Powers”, e Maléfica, de “A Bela Adormecida”, anexando gifs destes para ilustrar seu ponto. (“A perspectiva dos desenhos animados de Ipek é apropriada para alguém que vive em um mundo onde as pessoas que expõem fraudes são vilões e pessoas que as cometem são vítimas“, disse o Sr. Forge)
O e-mail da Sra. Irgit também continha alguns aspectos positivos. Ela apontou que não haveria atenção da imprensa e lutas legais sobre biquínis de crochê se ela não tivesse imaginado e comercializado uma marca global. “Eu devo ter feito algo certo“, escreveu ela.
De volta a Trancoso, perguntei a Sra. Ferrarini o que ela desejava que acontecesse com a Sra. Irgit. Ela respondeu com uma referência às cores do Brasil, e talvez do biquíni que ela tinha malha em existência. “Eu quero que ela se ferre em verde e amarelo”.
escrito por Katherine Rosman, publicado em 20.12.2018 no The New York Times
(tradução livre de oconsultorempatentes.com)
artigo original em NYT