Patente de software

Posso patentear um software? Posso patentear um aplicativo de celular? Programas de computador são considerados patenteáveis no Brasil? 

A resposta mais honesta a essa pergunta é: depende do caso concreto.

Na maioria das vezes, aquilo que o inventor intenciona ter protegido não poderá ser reivindicado em uma patente de software. Mas em alguns casos mais específicos é bastante factível o patenteamento de um programa de computador.

 

SOFTWARE EMBARCADO

A primeira pergunta que você tem de fazer para saber se o seu programa de computador é patenteável é: o meu software é um software embarcado? ou um software para smartphones e computadores pessoais?

Por “software embarcado” entenda: um programa de computador que só funciona em um determinado hardware industrial, por exemplo: o software que comanda o braço de um robô de solda; o software que regula os avionics de uma aeronave, permitindo que ela trafegue em piloto automático; o software que controla uma máquina de lavar roupas; o software do módulo eletrônico veicular, tudo isso é software embarcado.

Caso sua invenção seja um software embarcado, excelente, basta reivindicar o conjunto [hardware + software embarcado] que o pedido de patente terá grandes chances de ser deferido pelo INPI.

 

Claro, ainda será necessário o atendimento aos requisitos de novidade atividade inventiva (Art 8º da lei 9279 de 96, a LPI) para que se conceda a patente. Não se pode esperar que a mera cópia ou alteração superficial de algo conhecido possa ser patenteável no Brasil ou em qualquer outro lugar do mundo. O atendimento aos requisitos de novidade e atividade inventiva sempre será prerrogativa de concessão de patentes pertencentes a qualquer campo tecnológico, em qualquer país do mundo.

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Aliás, cumpre notar que, não somente os requisitos de novidade e atividade inventiva devem ser apreciados, mas todos os demais ditames da LPI devem ser observados para a concessão da patente do software. Cabe estudar atentamente os artigos 8º a 25 da LPI para averiguar o cumprimento de todos os demais requisitos legais para a concessão de sua patente.

 

EXEMPLO DE PATENTE PARA SOFTWARE EMBARCADO CONCEDIDA PELO INPI

PI0621882-2
Data de depósito: 17/07/2006
Título: Sistema automatizado para a produção e manejo de rolos de material de manta e robô destinado especialmente para o dito sistema.
Titular: A. Celli Nonwovens S.P.A.

 

 

Reivindicações, tal como concedidas:

1. Sistema para a produção de rolos de material de manta, caracterizado pelo fato de que compreende, em combinação, pelo menos, os seguintes componentes: – uma máquina para produzir o material de manta;  – um enrolador, que forma bobinas de material de manta provenientes da dita máquina de produção;  – um desenrolador para desenrolar bobinas unitárias de material de manta produzido pelo dito enrolador; – um grupo de ferramentas para o corte longitudinal do material de manta para dividir o dito material de manta em tiras, com elementos a fim de posicionar as ditas ferramentas em uma direção transversal com relação à direção de alimentação do material de manta;  – um rebobinador para rebobinar as tiras unitárias em rolos;  – uma linha para a embalagem dos rolos;   – pelo menos uma lançadeira para a transferência dos grupos de rolos formados pelo dito rebobinador – cortador para a dita linha de embalagem;  – um sistema de informação para o gerenciamento integrado dos ditos componentes do sistema.
 2. Sistema, de acordo com a reivindicação 1, caracterizado pelo fato de que o dito sistema de informação compreende um servidor de rede, um banco de dados contendo informações sobre os dados de processo e / ou dados de controle; uma pluralidade de computadores associados aos componentes do sistema; uma rede local que conecta o dito servidor e os ditos computadores. 

 

APLICAÇÃO INDUSTRIAL

Caso o seu software não seja um software embarcado, será mais difícil a concessão da patente. Mas nem tudo está perdido.

O mais difícil, nesse caso, é encontrar uma solução técnica a um problema técnico, que revele aplicação industrial (Art 8° e 15 da LPI). 

Soluções que brotam da cabeça do empresário em vez da cabeça do profissional de TI, geralmente não são patenteáveis. Exemplos:

– O primeiro app para a provisão de uma plataforma entre potenciais clientes que necessitam de uma carona e potenciais motoristas que aceitem receber dinheiro ao proverem caronas. (Tanto não é patenteável, que depois do Uber já surgiram  Cabfy,  99taxi, Didi, etc)

– O primeiro app para match de paqueras. (Tanto não é patenteável, que coexistem hoje: Tinder, Happn, Grindr, Bumble, etc

– O primeiro aplicativo de GPS que direciona o motorista pelo caminho mais rápido e sem trânsito. (Tanto não é patenteável que, G-maps e Waze já coexistiam com essa mesma funcionalidade, muito antes da compra do Waze pela Google. 

 

Aliás, além de não haver aplicação industrial nas três definições acima, essas definições também esbarram no artigo 10 – III da LPI:

Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade:

        […]

        III – esquemas, planos, princípios ou métodos comerciais, contábeis, financeiros, educativos, publicitários, de sorteio e de fiscalização;

        […] (artigo 10, Lei 9279 de 1996, LPI)

 

DIREITO AUTORAL E LEI DE SOFTWARE

Por outro lado, o código fonte e o código objeto dos apps das definições acima é objeto de proteção da lei de direito autoral em conjunto com a lei de softwares. (lei 9.610 de 1998 com lei 9.609 de 1998)

Para o código fonte e código objeto é possível realizar o registro de software no INPI. O registro do software, conduto, é apenas um meio de garantia da proteção da transcrição literal do código ou de partes do código. O registro de software não protege conceitos e ideias genéricas como faz a patente. 

Nesse ponto, cabe ler o inciso V do artigo 10 da LPI e a interpretação do texto desse inciso V pelo INPI: 

   Art. 10. Não se considera invenção nem modelo de utilidade:

        […]

        V – programas de computador em si;

        […] (artigo 10, Lei 9279 de 1996, LPI – grifou-se)

Interpretação dada pelo INPI ao texto do inciso V do artigo 10 da LPI:

O programa de computador em si, de que trata o inciso V do Art. 10 da LPI, refere-se aos elementos literais da criação, tal como o código fonte, entendido como o conjunto organizado de instruções escrito em linguagem natural ou codificada. O programa de computador não é considerado invenção e, portanto não é objeto de proteção por patente sem mera expressão de uma solução técnica, sendo intrinsecamente dependente da linguagem de programação. (item 2.1 da resolução 158 de 28 de novembro de 2016 do INPI)

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ARQUITETURA DE SOFTWARE E LÓGICA DE PROGRAMAÇÃO

O que sobra como patenteável em um software não-embarcado é a  arquitetura do software e a sua lógica (desde que novos e inventivos). Em outras palavras, desde que a nova arquitetura do software (ou sua lógica) solucione um problema técnico de um jeito novo, em uma solução que não pareça óbvia a um técnico em programação, em tese, essa nova arquitetura pode ser ser patenteada no Brasil.

Existem diversas patentes concedidas para softwares que atestam esse conceito. Seguem alguns exemplos de reivindicações de patentes de software concedidas pelo INPI:

1. Método para retorno de dados relativos a mensagens que devem ser apresentados a uma interface comum de transmissão de mensagens, de forma que os dados relativos a mensagens apresentadas possam ser acessados de modo mais eficiente em um sistema de computador que é conectável por rede em conjunto com um ou mais sistemas de computador distintos a uma rede, o método compreendendo a etapa de:

receber uma consulta relativa a mensagens a partir de um sistema de computador de consulta, a consulta relativa a mensagens incluindo critérios de consulta; caracterizado pelo fato de que compreende ainda as etapas de: acessar uma base de dados de itens, a base de dados de itens armazenando uma pluralidade de partes de dados relativos a mensagens, a pluralidade de partes de dados relativos a mensagens incluindo pelo menos uma primeira parte de dados relativos a mensagens e incluindo pelo menos uma segunda parte de mensagens relacionadas, a primeira parte de dados relativos a mensagens tendo um ou mais campos de propriedade que são definidos de modo diferente de um ou mais campos de propriedade da segunda parte de dados relativos a mensagens, a primeira parte de dados relativos a mensagens e a segunda parte de dados relativos a mensagens tendo também um ou mais campos de propriedade comuns, definidos de acordo com um esquema de mensagens; e

identificar uma pluralidade de partes de dados relativos a mensagens contidos na base de dados de mensagens que satisfazem os critérios de consulta da consulta relativa a mensagens, pelo menos uma parte identificada de dados relativos a mensagens tendo um ou mais campos de propriedade que são definidos de acordo com um primeiro esquema de extensão de mensagem de modo diferente de pelo menos uma outra parte identificada de dados relativos a mensagens definidos de acordo com outro diferente esquema de extensão de mensagem; retornar a pluralidade de partes de dados relativos a mensagens ao sistema de computador de consulta.

(reivindicação 1 de PI 0406210-8 – Microsoft – concedida em 2017)

1. Método implementado por computador relativo a prover um conteúdo em uma página, o método compreendendo:

Receber as informações para prover o conteúdo para um dispositivo de acesso em resposta a uma navegação de uma primeira página para uma segunda página, o conteúdo a ser incluído na segunda página;

Acessar as informações de consulta armazenadas no dispositivo de acesso, as informações de consulta baseadas em uma primeira consulta que foi submetida do dispositivo de acesso para um provedor de pesquisa antes de navegar para a primeira página; e

Prover o conteúdo para a inclusão na segunda página, o conteúdo selecionado utilizando pelo menos as informações recebidas e as informações de consultas acessadas.

(reivindicação 1 de PI   0906987-9 – Google – concedido em 2019)

1. Método implementado em computador (1000) caracterizado pelo fato de que compreende: definir, por um ou mais computadores (1000), primeiros critérios de avaliação para uma possível localização de fonte muito próxima, uma possível localização de fonte menos distante e uma possível localização de fonte mais distante; associar métricas de local (166) correspondentes com os primeiros critérios de avaliação; classificar a localização de fonte muito próxima, a localização de fonte menos distante e a localização de fonte mais distante em relação aos primeiros critérios de avaliação e à métrica de local correspondente para gerar as classificações de localização para cada localização de fonte (162); selecionar uma localização de fonte (162) dentre a localização de fonte muito próxima, a localização de fonte menos distante e a localização de fonte mais distante, que é mais qualificada para receber um processo operacional (102) sob avaliação, com base nas classificações da localização; definir segundos critérios de avaliação para um provedor próprio e um possível provedor de terceiros; associar métricas de provedor correspondentes com a segunda avaliação; classificar o provedor próprio e o provedor de terceiros em relação aos segundos critérios de avaliação e às métricas de provedor para gerar as classificações de provedor para cada provedor; e selecionar um provedor dentre o provedor próprio e o provedor de terceiros, que é mais qualificado para executar o processo operacional (102) sob avaliação, com base nas classificações de provedor.

(PI 0705942-6 – ACCENTURE – concecida em 2019)

Ari Magalhães 

ari.m@mnip.com.br

(MAIS EXEMPLOS DE PATENTES DE SOFTWARE CONCEDIDAS PELO INPI)

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