Apesar de relativamente incomuns, processos de nulidade de patentes concedidas, ou seja, processos que pretendem anular a decisão de concessão de um pedido de patente, são possíveis de ocorrer. Ainda, existem duas formas disso acontecer: o processo de nulidade administrativa e o processo de nulidade judicial. É disso que trata o presente artigo.
O QUE É NULIDADE
Antes de aprofundar na forma como os processos de nulidade podem ocorrer, é interessante definir o que exatamente a palavra nulidade significa, em especial no contexto jurídico de patentes.
De acordo com o Google, nulidade significa “qualidade do que é nulo, do que não existe”. Disso, entende-se que nulidade se refere a algo que, embora possa ter sido válido em algum momento, deixa de ter sua existência considerada a partir do momento que é declarado nulo.
Ainda, no âmbito jurídico, alinhado ao Novo Código do Processo Civil (CP – Lei nº 13.105/15), nulidade é definida da seguinte forma:
“É a ineficácia do ato ou relação processual, causada pela não observância da lei. Pode ser absoluta, quando a grave violação à lei torna o vício insanável, ou relativa, quando torna o ato apenas anulável, possibilitando que o vício seja suprido pelas partes”
Com isso, destaca-se que a nulidade pode se dar no âmbito absoluto, ou seja, que tem efeito sobre todo e qualquer contexto, mesmo fora de um processo específico; e no âmbito relativo, ou seja, a nulidade se dá apenas em um contexto específico.
O artigo Como Anular Uma Patente? deste mesmo também explora esse tema.
NULIDADE ADMINISTRATIVA
A seção II da Lei de Propriedade Industrial (LPI – LEI Nº 9.279, DE 14 DE MAIO DE 1996) é dedicada para o processo administrativo de nulidade, nos artigos 50 a 55.
O processo de nulidade administrativa pode ser instaurado no prazo de até 6 meses, contados a partir da concessão da patente, conforme art. 51 da LPI. Após esse prazo, somente é possível requerer a nulidade de uma patente por via judicial.
Ainda conforme o art. 51 da LPI, o processo de nulidade administrativa pode ser requerido por qualquer pessoa com legítimo interesse. A questão é, quem pode ser considerada uma pessoa com legítimo interesse?
“Toda e qualquer pessoa, física ou jurídica, que tenha interesse na livre utilização da invenção, concorrente do titular ou não, terá interesse na declaração de nulidade da patente que a protege” (Direito de patentes: Condições Legais de Obtenção e Nulidades. Jacques Labrunie. p.117).
No momento de requerer um pedido de nulidade, o requerente não precisa apresentar provas de seu legítimo interesse. É possível, no entanto, a seguinte situação:
“O Requerente da nulidade pode ser compelido a demonstrar o legítimo interesse a qualquer momento, a requerimento do titular da patente ou por determinação de ofício do INPI, havendo fundada suspeita de inexistência do interesse legítimo.” (Direito de patentes: Condições Legais de Obtenção e Nulidades. Jacques Labrunie. p.117)
Os arts. 52 e 53 da LPI dizem respeito aos prazos de resposta para cada uma das partes desse tipo de ação, a o art. 54 prevê que, mesmo que não apresentadas as manifestações, o processo será decidido pelo Presidente do INPI, o processo de nulidade administrativa deve ser finalizado.
É interessante destacar as diferenças entre uma patente que é extinta, após o seu período de vigência, e o que é uma patente nula.
- Patente extinta: ocorre após o prazo de validade, por renúncia do depositante, por caducidade ou por falta de pagamento de anuidade. Seu efeito é ex nunc, ou seja, o direito de patente deixa de existir somente a partir da data em que a patente é declarada extinta, leia-se daquela data em diante.
- Patente nula: pode ocorrer por via de processo administrativo ou judicial. Seu efeito é ex tunc, ou seja, após ser declarada nula em âmbito absoluto, o direito de patente deixa de valer retroativamente, ou seja, é como se a patente nunca tivesse sido concedida. Isso é interessante porque, se uma patente é nula, o seu efeito de impedir terceiros (vide artigo Patente E Monopólio para saber mais sobre o tema) não deve ter efeito em nenhum momento do tempo-espaço. Assim, torna-se impossível acusar alguém de infração daquela patente. O artigo Patente Anulada Desfaz Trânsito Em Julgado traz um exemplo desse tipo de situação.
NULIDADE JUDICIAL
A seção III da LPI é dedicada para o processo judicial de nulidade, nos artigos 56 e 57.
É interessante destacar, no entanto, que mesmo que não houvesse previsão de processo de nulidade judicial na LPI, seria possível que uma parte interessada questionasse a decisão de uma patente concedida pelo INPI.
O art. 5º da CF88, inciso XXXV, prevê o seguinte:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
Isso significa que:
“É princípio geral do direito administrativo, elevado à norma constitucional, que todo ato administrativo é passível de revisão pelo judiciário. Trata-se do princípio do controle judicial dos atos administrativos.
Conclui-se, portanto, que, mesmo se inexistisse previsão legal específica, os atos de concessão ou denegação de patente estariam sujeitos à revisão judicial” (Direito de patentes: Condições Legais de Obtenção e Nulidades. Jacques Labrunie. p.119)
Voltando ao que está previsto na LPI, são destacados a seguir os cenários em que pode ser interessante para uma parte entrar com um processo de nulidade judicial:
“Hipóteses de prazos para alegação de nulidade:
– A patente concedida está vigente; não há dúvida sobre a existência de interesse na declaração de nulidade, por parte de concorrentes, inventores da mesma área ou afins, partícipes da cadeia mercadológica, consumidores etc., visando à extinção da exclusividade de exploração da invenção, conferida pela patente;
– A patente já expirou e o titular está acionando contrafatores, pelo período passado de violação; nos termos do § 1 º, do art. 56, da Lei n. 9.279/96, “a nulidade da patente poderá ser arguida, a qualquer tempo, como matéria de defesa”. É óbvio o interesse da parte que está sendo acionada por contrafração de patente em ver declarada sua nulidade a qualquer tempo.
– A patente já expirou e o titular não está acionando ou ameaçando ninguém por eventual violação passada; qualquer interessado pode promover a ação de nulidade, para ver declarado que, mesmo no passado, e apesar da inércia do titular, não houve violação de direitos. O interesse, nesse caso, seria de prevenir futura ação penal de contrafração de patente ou ação civil de perdas e danos, por parte do titular da patente.” (Direito de patentes: Condições Legais de Obtenção e Nulidades. Jacques Labrunie. p.122)
É relevante destacar a importância da realização de perícia técnica no contexto de processos de nulidade judicial. Isso porque sim, cabe ao juiz tomar a decisão final relativa ao processo de nulidade judicial, mas não está dentro de sua jurisdição ter conhecimento técnico em toda e qualquer área relacionada a uma patente que seja submetida a um processo de nulidade judicial.
Imagine que você é engenheiro de telecomunicação e vai entrar com um processo de nulidade judicial contra uma patente concedida de uma empresa concorrente. Agora pense que o mesmo juiz responsável pelo seu processo pode também julgar uma ação judicial que envolva uma patente de remédio para dor de cabeça.
Seria razoável esperar que esse juiz tivesse o conhecimento técnico necessário para revisitar as questões de mérito de uma patente de áreas tão distintas? Claro que não! Daí a extrema importância da perícia técnica neutra, ou seja, que elabore um parecer frio, sem tomar o lado de alguma das partes, nesse contexto.
Com isso, o papel de tomar a decisão final ainda é do juiz, mas o papel de entender a invenção e analisá-la tecnicamente passa para as mãos de alguém com mais conhecimento técnico específico.
A SENTENÇA DE UM PROCESSO DE NULIDADE
Seja uma patente anulada por via administrativa ou por via judicial, uma vez que uma nulidade absoluta é definida, esse ato precisa se tornar público, assim como todas as outras ações são públicas durante o processo de exame de uma patente até a sua concessão.
Desse modo, a sentença de nulidade é obrigatoriamente publicada no INPI.
Existe a possibilidade uma patente ser declarada nula em um contexto muito específico, dentro de um processo de infração de patente, por exemplo. Essa possibilidade é explorada no artigo O STJ e a interpretação do art. 56, § 1º, da Lei da Propriedade Industrial: É possível a arguição de nulidade incidental de patentes na justiça estadual?
CONCLUSÃO
A nulidade de uma patente é completamente possível, mas para que isso ocorra são necessárias algumas ações das partes envolvidas.
Todo o processo de concessão e nulidade de uma patente envolve o INPI, sendo que ambas as situações demandam o envolvimento de profissionais técnicos na área tecnológica da patente que está sob análise.
O MNIP tem vasta experiência em todo o processo de concessão e também de conflitos relacionados a patentes, incluindo processos de nulidade. Caso esteja sendo acionado para um processo de nulidade ou queira requerer esse tipo de processo, nossa equipe de advogados e cientistas ficará feliz em fornecer toda a orientação e suporte técnico necessários.
Uma resposta
Olá Maiara! Tudo bem?
Li seu artigo depois de uma busca no google.
Estou tendo alguns problemas relacionados a personagens infantis e o conteúdo do seu blog abriu um pouco a minha visão sobre a nulidade de patente
e o que isso pode servir a meu favor e de outras pessoas com o mesmo problema., nulidade judicial, é uma alternativa.
Agradeço demais!